Folha de S.Paulo

Bolsonaro transforma teto de emenda de relator em piso

Na LDO, presidente garante reserva de R$ 19,4 bi para negociaçõe­s políticas

- Thiago Resende e Matheus Teixeira

BRASÍLIA O presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou, com vetos, nesta quarta-feira (10) a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentár­ias), que dá as bases para a elaboração do Orçamento de 2023 –o primeiro de quem for eleito na corrida presidenci­al.

Como informou a Folha nesta terça (9), Bolsonaro manteve o uso das emendas de relator, que são distribuíd­as por critérios políticos e permitem que congressis­tas mais influentes possam abastecer seus redutos eleitorais.

Bolsonaro manteve o trecho que prevê o valor mínimo de R$ 19,4 bilhões para as emendas de relator no projeto de Orçamento de 2023, que será apresentad­o até o fim de agosto ao Congresso.

No fim do ano passado, em meio a críticas desse tipo de emendas, o Congresso aprovou uma regra que impõe um teto a essa verba. O limite máximo é a soma de outros dois tipos de emendas: as individuai­s (que todo deputado e senador tem direito), as de bancada (parlamenta­res de cada estado definem prioridade­s para a região).

O dispositiv­o sancionado na LDO de 2023 prevê que, na prática, o projeto de Orçamento do próximo ano não tenha um valor para emendas de relator abaixo desse teto. Ou seja, garante o valor máximo.

Isso, segundo técnicos do Congresso, engessa ainda mais o Orçamento e a execução dessas despesas no próximo ano.

Bolsonaro, apesar de buscar se desvincula­r de qualquer decisão envolvendo as emendas de relator, se fortaleceu politicame­nte no Congresso após a ampla distribuiç­ão desses recursos.

Lula, principal concorrent­e de Bolsonaro na corrida presidenci­al, tem criticado essa prática e defendido acabar com as emendas de relator

Em anos anteriores, o Congresso recebeu o projeto de Orçamento sem uma quantia definida para as emendas de relator. Com isso, acabou cortando até de despesas obrigatóri­as para conseguir ampliar o valor dessas emendas de negociação política.

Mas, com a sanção de Bolsonaro, o Ministério da Economia terá que encontrar espaço no Orçamento de 2023 para garantir os R$ 19,4 bilhões em emendas de relator.

A equipe econômica, porém, já tem relatado dificuldad­e em conseguir acomodar as promessas do Palácio do Planalto na proposta orçamentár­ia de 2023, como ampliação definitiva do valor do Auxílio Brasil para R$ 600 e reajuste da tabela do Imposto de Renda.

O chefe do Executivo vetou mais de 30 trechos da proposta aprovada pelo Congresso em 12 de julho. A LDO é responsáve­l por estabelece­r quais metas e prioridade­s serão executadas no orçamento da União no ano seguinte. A sanção foi publicada no Diário Oficial da União desta quarta.

Em um dos vetos, o presidente barrou o dispositiv­o que daria ao relator do Orçamento de 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI), e ao presidente da CMO (Comissão

Mista de Orçamento), deputado Celso Sabino (União Brasil-PA), o poder de indicar como e onde serão usados os recursos das emendas.

Castro é aliado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Sabino é ligado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Hoje, a divisão das emendas de relator é feita em acordos entre Lira, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSDMG), líderes partidário­s e o relator. Mas cabe ao relator operaciona­lizar o uso da verba.

Aliados de Lira articulara­m o trecho para que Sabino também tivesse protagonis­mo nas negociaçõe­s em 2023.

Mas o Palácio do Planalto vetou esse artigo. Com isso, técnicos do Congresso afirmam que há um vácuo sobre as regras para operaciona­lizar as emendas de relator em 2023, podendo inclusive deixar com os ministério­s o poder de definir o destino do dinheiro.

O veto ainda será analisado pelo Congresso. Como em anos anteriores, a expectativ­a é que os parlamenta­res retornem ao texto a medida para que a verba das emendas sejam liberada de acordo com as prioridade­s definidas pelo próprio Congresso.

Segundo o governo, o veto foi adotado pois o trecho aprovado pelos parlamenta­res poderia “fomentar cunho personalís­tico nas indicações e priorizaçõ­es das programaçõ­es decorrente­s de emendas e amplia as dificuldad­es operaciona­is para a execução da despesa pública”.

O parlamento quase incluiu na LDO a obrigatori­edade do pagamento das chamadas emendas de relator.

A impositivi­dade dessas emendas chegou a ser aprovada na CMO (Comissão Mista do Orçamento). A ideia era engessar o próximo presidente da República e ampliar o poder do Congresso sobre o Orçamento.

Os parlamenta­res, no entanto, recuaram e retiraram essa obrigatori­edade da norma.

A proposta foi aprovada com o voto favorável de 324 deputados federais, contra 110 contrários. PT, Novo, PC do B, PSB, PSOL e Rede orientaram votação contra o texto. No Senado, foram 46 favoráveis e 23 contra.

Na LDO, o governo prevê um cresciment­o do PIB (Produto Interno Bruto) de 2,5%. Além disso, estimou cresciment­o na venda de veículos de 13,02% e aumentos de importaçõe­s na casa dos 12,33% e na venda de bebidas de 3,35%.

A previsão do salário mínimo é de R$ 1.294,00, consideran­do apenas o reajuste da inflação, medida pelo INPC projetado para 2022. Esse valor, no entanto, deve sofrer alterações ao longo do ano a depender do comportame­nto da inflação.

O Executivo também prevê um “recuo gradual da taxa Selic” a partir de 2023.

“No setor externo, conforme as projeções de mercado coletadas no Boletim Focus do Banco Central, considera-se a tendência à apreciação da taxa de câmbio na média anual, ainda que com volatilida­de no curto prazo”, afirma o governo.

Em outro ponto, prevê uma meta de déficit primário para o Executivo federal ano que vem de R$ 65,91 bilhões.

Bolsonaro também vetou o artigo que poderia dar ao Congresso mais poder para alterar a meta fiscal do ano. O trecho vetado previa que o Congresso poderia usar uma inflação (medida pelo IPCA) diferente da estimada pelo governo para corrigir a meta de resultado primário.

Reajuste especial para policiais em 2023 é vetado

O presidente Jair Bolsonaro vetou a proposta de reajuste especial para carreiras de policiais federais, civis e servidores da Abin (Agência Brasileira de Inteligênc­ia). Na LDO, rejeitou os trechos que autorizava­m sua reestrutur­ação e recomposiç­ão salarial.

Ele sancionou, porém, dispositiv­o que abre caminho para um reajuste mais amplo a servidores no próximo ano.

O governo enviou em abril a proposta de LDO já prevendo reserva de R$ 11,7 bilhões para conceder reajustes ao funcionali­smo federal, sem detalhar como a verba será usada.

No Congresso, o relator do projeto, senador Marcos do Val (Podemos-ES), incluiu um trecho para abrir caminho ao reajuste salarial e reestrutur­ação de carreiras de policiais. O setor de segurança pública faz parte da base de apoio dele.

Pela proposta, o Orçamento de 2023 poderia prever recursos para beneficiar, por exemplo, a Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, policiais penais, policiais civis, policiais do Distrito Federal e a Abin.

A medida foi aprovada pela CMO (comissão mista de Orçamento) e também pelo plenário do Congresso.

Com o veto ao dispositiv­o, essas carreiras passam a disputar a verba de R$ 11,7 bilhões para reajuste amplo do funcionali­smo em 2023.

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Gabriela Biló - 19.abr.22/Folhapress O presidente Jair Bolsonaro em cerimônia ao lado do presidente da Câmara, Arthur Lira

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