Folha de S.Paulo

Irlanda do Norte terá primeiro partido nacionalis­ta no poder

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A Irlanda do Norte assistiu neste sábado (7) àquilo que analistas locais descreviam como uma mudança sísmica no país. O Sinn Féin, antigo braço político do Exército Republican­o Irlandês (IRA), conquistou a maior fatia da Assembleia regional e, assim, tornou-se a principal força política da nação de 1,9 milhão de habitantes.

O peso do anúncio se dá pelo fato de o partido ser o primeiro de viés nacionalis­ta a obter controle desde que o país foi formado, há 101 anos, em 1921. Lideranças partidária­s já indicaram o assunto que deve dominar a política local: pediram um “debate honesto” sobre a unificação com a República da Irlanda, que é a principal bandeira do Sinn Féin.

Com a apuração perto de ser finalizada, a sigla de Michelle O’neill conquistou 27 assentos, empurrando o Partido Unionista Democrátic­o (DUP) para o segundo lugar, com 24 —a Assembleia tem 90 e inclui partidos menores.

O’neill disse que os resultados são um momento decisivo para a política e para o povo. “Hoje se inaugura uma nova era que, acredito, apresenta a todos nós uma oportunida­de de reimaginar as relações nesta sociedade com base na igualdade e na justiça social.”

O Sinn Féin obteve 29% dos votos de primeira preferênci­a dos cidadãos para o Parlamento —no país, o eleitor deve apontar seu principal candidato e também assinar nomes de reserva—, enquanto o DUP obteve 21,3%, uma queda de sete pontos percentuai­s em relação à eleição de 2017.

Durante a campanha, a legenda, de maneira tática, não insistiu na pauta da unificação irlandesa, concentran­dose em questões relacionad­as ao custo de vida e à crescente fila de espera no sistema de saúde, estratégia que parece ter surtido efeito nas urnas.

A lei da Irlanda do Norte costurada após o Acordo de Belfast, assinado em 1998 para pôr fim aos confrontos na região, afirma que o país é parte do Reino Unido e não deixará de sê-lo sem o consentime­nto da maioria da população. Acrescenta que uma votação deve ser realizada caso a maior parte da sociedade desejasse unir-se à Irlanda.

A vitória do Sinn Féin, por óbvio, não muda o status da região, já que possíveis referendos demorariam anos até serem estruturad­os e acordados com o Reino Unido, mas tem grande peso simbólico.

Embora o maior partido tenha o direito de apresentar o candidato a primeiro-ministro —e O’neill é a mais cotada—, o governo de compartilh­amento obrigatóri­o exige que haja acordo mínimo com o DUP, de modo que a oposição indique o nome para vicepremiê. Assim, formar o Executivo pode demorar meses.

Emendas feitas à Constituiç­ão para evitar um possível colapso da Assembleia dão aos eleitos até quatro janelas de seis semanas —seis meses, no total— para consolidar um governo. Os ministério­s são distribuíd­os entre as siglas, de acordo com a fatia de cada uma nas eleições.

O líder do DUP, Jeffrey Donaldson, afirmou que um acordo com o adversário Sinn Féin estaria condiciona­do a uma total revisão do polêmico protocolo que rege o comércio do país com o resto do Reino Unido desde o brexit.

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