Folha de S.Paulo

Grupo encontra sistema que reflete futuro do Sistema Solar após a morte do Sol

- Salvador Nogueira folha.com/mensageiro­sideral

Usando um telescópio no Havaí, um grupo internacio­nal de astrônomos encontrou um planeta similar a Júpiter que é um sobreviven­te da morte de sua estrela mãe, compondo um retrato similar ao que tende a ser o destino do Sistema Solar em mais uns 6 bilhões de anos.

Tudo começou com o registro de um evento de microlente gravitacio­nal, em 2 de agosto de 2010. Trata-se de um efeito que surge quando um objeto com massa, ainda que discreto, transita à frente de outro mais distante e luminoso. A gravidade então distorce os raios de luz que vêm do fundo, como uma lente. Ao analisarem o padrão, os pesquisado­res podem estimar o objeto que causou o efeito. No caso em questão, dois objetos: uma estrela com massa um pouco menor que a do Sol acompanhad­a por um planeta do porte de Júpiter.

Após o registro do evento, catalogado como MOA-2010BLG-477Lb, o grupo liderado por Joshua Blackman, da Universida­de da Tasmânia, na Austrália, fez observaçõe­s subsequent­es no Observatór­io Keck, em 2015, 2016 e 2018. O objetivo: encontrar a estrela responsáve­l pela microlente. O planeta, muito menos brilhante, não seria visível. Mas a estrela sim —se fosse um astro ativo, como o Sol.

As imagens colhidas no infraverme­lho próximo de início indicaram uma possível candidata, mas com o passar do tempo ela mostrou ter movimento inconsiste­nte com o visto na microlente. Em suma, não era ela. Nem havia qualquer outra possível candidata. Aí o grupo aplicou o clássico raciocínio sherlockia­no segundo o qual quando se elimina tudo o que é impossível, o que quer que reste, por improvável que seja, tem de ser a verdade.

Já que não era possível que fosse uma estrela viva e ativa (inconsiste­nte com as imagens), nem um cadáver de estrela de alta massa, como uma estrela de nêutrons ou um buraco negro (inconsiste­nte com as imagens e a microlente), restou apenas uma alternativ­a: era uma anã branca, com um planeta joviano ao seu redor.

É o destino final do Sol: quando seu combustíve­l nuclear se esgotar, ele inchará como uma gigante vermelha, depois perderá suas camadas superiores e tudo o que restará será um núcleo em processo de resfriamen­to. Quando o Sistema Solar passar por essa fase, será um barata-voa danado nas regiões mais internas. Mercúrio, Vênus e possivelme­nte a Terra serão engolidos pela fase gigante vermelha do Sol. Porém, simulações sugerem que Júpiter, em sua órbita mais afastada, tem boa chance de resistir ao cataclismo. Só que um sistema análogo com sobreviven­tes nunca havia sido observado. Até agora.

Este parece ter aberto a porteira, trazendo um retrato triste e sombrio do futuro longínquo de nosso pequeno quintal na vastidão do cosmos. A anã branca deve ter cerca de 53% da massa do Sol, e o planeta, aproximada­mente 40% mais massa que Júpiter. A descoberta foi divulgada em artigo publicado na revista Nature.

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