Comissão do Senado dos EUA veta uso de verbas para remover quilombolas em Alcântara
“Nenhum dos recursos providos por esta lei ou por leis anteriores podem estar disponíveis para forças de segurança do Brasil que se envolvam em reassentamentos forçados de comunidades indígenas ou quilombolas
washington A Comissão do Senado dos Estados Unidos responsável pela alocação de verbas determinou que o governo americano impeça que recursos destinados a ações no Brasil sejam usados na remoção de comunidades indígenas e quilombolas da região de Alcântara (MA).
O veto foi incluído na proposta de orçamento para o ano fiscal de 2022 do Departamento de Estado, que inclui repasses para ações no exterior.
“A Comissão está preocupada com os relatos de que o governo do Brasil planeja forçar a realocação de centenas de famílias quilombolas para expandir o Centro de Lançamento de Alcântara. Nenhum dos recursos providos por esta lei ou por leis anteriores podem estar disponíveis para forças de segurança do Brasil que se envolvam em reassentamentos forçados de comunidades indígenas ou quilombolas”, afirma o comitê.
O órgão é liderado pelo democrata Patrick Leahy, mas a construção do orçamento é esforço bipartidário. Apresentado na segunda (18), o documento ainda precisa ser aprovado pelo plenário da Casa.
As leis sobre o orçamento do governo dos EUA são apresentadas de modo separado, mas debatidas em conjunto. Os democratas podem aprovar leis orçamentárias sem apoio republicano, ao usar chamado mecanismo de reconciliação.
A proposta de orçamento do Departamento de Estado prevê US$ 17 milhões (R$ 94,5 milhões) para ajuda ao desenvolvimento do Brasil, a serem administrados pela Usaid (Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional), e outros US$ 20 milhões (R$ 111 milhões) para ações relacionadas a programas ambientais na Amazônia brasileira.
Os EUA e o Brasil fecharam um acordo para que os americanos utilizem a base de Alcântara, no Maranhão, para lançamentos de foguetes. O acerto foi firmado por Jair Bolsonaro com o então presidente americano Donald Trump, em março de 2019, e depois aprovado pelos Congressos dos dois países. O decreto de promulgação do tratado foi assinado pelo líder brasileiro em fevereiro de 2020.
Pelo acerto, os americanos poderão fazer uso comercial da base em troca de recursos para que o Brasil invista no desenvolvimento do programa espacial brasileiro. Na época da negociação, estimava-se que o país poderia receber até US$ 10 bilhões por ano. O governo diz que seguirá com controle total da base e que os americanos farão um uso comercial do espaço, mas sob jurisdição brasileira.
Em outubro de 2019, a Folha mostrou que um plano para remover cerca de 350 famílias de quilombolas da região estava em fase avançada. Elas seriam retiradas dali para permitir a ampliação do CLA (Centro de Lançamentos), comandado pela Aeronáutica,
Comissão do Senado dos EUA em proposta de orçamento do Departamento de Estado
a fim de alugar espaços para operações de outros países.
Em março do ano passado, o governo publicou a resolução que previa a remoção de moradores. Decisão da Justiça Federal, porém, suspendeu a retirada, e o Ministério Público Federal recomendou o adiamento da operação em razão da pandemia. Assim, o governo se comprometeu a não remover quilombolas de Alcântara durante a crise de Covid.
Há o temor, no entanto, de que a melhora na situação da pandemia no país possa levar o governo a rever sua posição. “A questão está um pouco adormecida, mas a gente sabe que eles [o governo] não estão parados”, diz Célia Pinto, coordenadora da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos).
Ela estima que 800 famílias possam ter de deixar a região caso os planos de expansão das atividades da base de Alcântara avancem.