Morre Francisco Weffort, pensador da democracia
Cientista político ajudou a fundar o PT e foi ministro da Cultura do governo Fernando Henrique
Francisco Weffort, o cientista político que ajudou a fundar o PT, foi ministro da Cultura de Fernando Henrique Cardoso e escreveu extensivamente sobre democracia e populismo no Brasil, morreu ontem no Rio aos 84.
são paulo O cientista político Francisco Weffort morreu, aos 84 anos, na noite do último domingo (1º), no Rio de Janeiro, durante um procedimento médico.
Weffort foi fundador, ideólogo e um dos principais dirigentes do PT. Na década de 1990, saiu da legenda e comandou o Ministério da Cultura no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Afastou-se do partido que fundou a ponto de defender o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) em 2016.
O intelectual tratava de um problema do coração diagnosticado recentemente. Ele estava em Petrópolis (RJ) no sábado (31), quando sofreu um desmaio. Levado para o Rio, chegou a ser preparado para uma cirurgia que previa a desobstrução de artérias e a colocação de uma válvula na aorta, mas não resistiu aos procedimentos iniciais. Deixa a mulher, Helena Severo, e sete filhos.
Reconhecido como um dos principais intelectuais do país, Weffort tinha como eixo central de sua vida acadêmica a reflexão sobre a democracia e o populismo no Brasil e escreveu livros clássicos como “Formação do Pensamento Político Brasileiro”, “Por que Democracia” e “Qual Democracia?”.
Helena, que viveu com ele por 25 anos, afirma que Weffort “estava ativo e lúcido até seus últimos dias, lendo, pensando, formulando. Ele era um intelectual raro, um pensador, um formulador, um estudioso obsessivo que tinha a alma do pesquisador. Atuou na esfera política, mas gostava de se qualificar sobretudo como um professor”.
Segundo ela, Weffort estava preocupado com os rumos do Brasil. Seu último trabalho publicado foi “Crise da Democracia Representativa e Neopopulismo no Brasil”, com o professor José Álvaro Moisés.
“Ele foi um dos principais pensadores da nossa democracia, lançou sementes intelectuais de extraordinária importância, principalmente na área da esquerda, no chamamento para que a esquerda brasileira entendesse e contribuísse com os valores da democracia”, afirma Moisés.
Weffort morre logo depois de outros dois intelectuais de ponta do país —o sociólogo e cientista político Leôncio Martins Rodrigues, morto em maio deste ano, e o filósofo José Arthur Giannotti, na semana passada.
Formado em ciências sociais pela USP, ingressou no quadro de docentes da instituição em 1961 e lecionou na graduação até o golpe de 1964.
No período seguinte, Weffort teve passagens pelo Instituto Latino-Americano de Planificação Econômica e Social (Ilpes), sediado no Chile, pela Universidade de Essex, na Inglaterra, e pela Universidade de La Plata, na Argentina, onde também atuou como assessor da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
Na década de 1970, integrou o corpo de pesquisadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e foi um dos fundadores do Centro de Estudos de Cultura Contemporânea (Cedec). Em 1977, tornou-se livre docente na USP e, no ano seguinte, publicou “O Populismo na Política Brasileira”.
Entre 1990 e 1992, deu aulas no Woodrow Wilson Center e no Helen Kellogg Institute, da Universidade de Notre Dame, nos Estados Unidos.
De volta ao Brasil, assumiu a chefia do Departamento de Ciência Política da USP.
Francisco Weffort será enterrado em São Paulo.
Nesta segunda, políticos e colegas de academia lamentaram a morte. “Nas últimas semanas, perdi três grandes amigos [Rodrigues, Giannotti e Weffort]. Pessoalmente a perda foi grande, assim como também perde a cultura brasileira” declarou FHC.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também se manifestou. “Weffort foi um cientista político que marcou a academia, um professor por vocação e um intelectual público dedicado a pensar sobre a democracia e o Brasil, não só estudando e refletindo sobre nossa realidade, mas também atuando como cidadão pelas causas que acreditava para um país melhor.”
Juca Ferreira, que foi ministro da Cultura nos governos Lula e Dilma, disse que “contribuiu com suas reflexões sobre a natureza singular do capitalismo dependente e periférico, sobre o fenômeno do populismo e, nos últimos tempos, vinha se dedicando a estudos sobre a democracia”.
O cientista político André Singer disse que Weffort “deixa uma herança fundamental para a ciência política no Brasil”.