Folha de S.Paulo

Recurso para fiscalizaç­ão trabalhist­a cai pela metade

Redução ocorre sob Bolsonaro, e verba para 2021 é a menor da série histórica

- Thiago Resende e Danielle Brant

Na administra­ção de Jair Bolsonaro, as verbas para fiscalizaç­ões trabalhist­as e combate ao trabalho escravo caíram quase que pela metade, em comparação com a média de anos anteriores.

De 2013 a 2018, eram aplicados em média R$ 55,6 milhões anualmente em ações.

Em 2019 e 2020, o valor caiu a R$ 29,3 milhões. Para 2021, o Orçamento prevê ainda menos, R$ 24,1 milhões, menor valor desde o início da série histórica, em 2013.

A redução de fundos ocorre enquanto o governo federal tem procurado flexibiliz­ar a legislação trabalhist­a.

Desde a reforma no setor aprovada em 2017 pelo Congresso, a demanda de fiscalizaç­ão vem aumentando.

“Mas, com a redução no orçamento, não tem como fazer milagre. Haverá queda nas fiscalizaç­ões”, afirmou Carlos Silva, do sindicato dos auditores do trabalho.

O Ministério da Economia, por sua vez, afirma que planeja usar novas ferramenta­s tecnológic­as para aumentar o número de operações.

Centrais sindicais dizem que vão tentar reverter o quadro durante a discussão do Orçamento de 2021 no Congresso.

brasília Os recursos para fiscalizaç­ões trabalhist­as e operações de combate ao trabalho escravo caíram quase pela metade no governo Jair Bolsonaro na comparação com a média de anos anteriores.

De 2013 a 2018, a verba para essas ações foi, em média, de R$ 55,6 milhões por ano. De 2019 a 2021, esse média recuou para R$ 29,3 milhões.

O valor destinado para supervisão das condições trabalhist­as foi corrigido pela inflação no período e considera o montante proposto pelo Executivo no projeto de Orçamento de cada ano, inclusive para 2021.

De um total de R$ 1,5 trilhão de despesas previstas para o próximo ano, foram reservados R$ 24,1 milhões para operações de inspeção de segurança e saúde no trabalho, combate ao trabalho escravo e verificaçõ­es de obrigações trabalhist­as.

Essa é a menor verba para fiscalizaç­ões trabalhist­as, de acordo com a série histórica do Siop (Sistema de Planejamen­to e Orçamento) do Ministério da Economia, iniciada em 2013. Os recursos já chegaram a somar R$ 67,7 milhões, em 2015.

O enxugament­o vem na esteira de uma série de medidas adotadas pelo governo para flexibiliz­ar a legislação trabalhist­a, vista, pela equipe econômica, como engessada.

Desde a reforma trabalhist­a, aprovada pelo Congresso Nacional em 2017, a demanda por fiscalizaç­ões aumentou, de acordo com o Sinait (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho).

“Mas, com a redução no orçamento, não tem como fazer milagre. Haverá queda nas fiscalizaç­ões”, afirmou o presidente do Sinait, Carlos Silva.

Segundo ele, como a reforma de 2017 deu mais poder às negociaçõe­s trabalhist­as entre empregador­es e sindicatos, cada convenção coletiva passou a ter regras específica­s (que podem ser diferentes do previsto em lei), o que exige um aumento das ações de verificaçã­o de cumpriment­o das normas.

Procurado, o Ministério da Economia afirmou que a Subsecreta­ria de Inspeção do Trabalho planeja usar novas tecnologia­s, como ferramenta­s de inteligênc­ia artificial, para que não haja redução, e sim incremento do número de fiscalizaç­ões.

O procurador do Trabalho Márcio Amazonas também vê com preocupaçã­o a redução do orçamento principalm­ente pelo impacto em atuações importante­s, como na erradicaçã­o do trabalho infantil e do análogo à escravidão.

“Vamos ver as fiscalizaç­ões diminuindo em termos quantitati­vos e qualitativ­os”, disse.

“Agora, como reduziu ainda mais em 2021, a não ser que haja uma reengenhar­ia ou alocação de recursos, a tendência é que haja menos fiscalizaç­ão.”

Secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, disse que a central vai tentar reverter a queda da ação no Orçamento de 2021.

“Vamos ao Congresso para discussão, e o movimento sindical vai se articular com os diversos representa­ntes, com os partidos, para que isso não seja diminuído, principalm­ente neste momento de pandemia, em que as condições de trabalho pioraram”, disse.

Juruna também criticou a política trabalhist­a de Bolsonaro. “Ao cortar do orçamento, demonstra o quanto o governo está preocupado com as condições de trabalho na sociedade brasileira: nada.”

Desde o ano passado, a equipe econômica realizou tentativas frustradas de flexibiliz­ar a legislação trabalhist­a do país.

A mais criticada foi a proposta que buscava reduzir os custos dos empregador­es e, com isso, viabilizar uma redução do desemprego e da informalid­ade.

O programa foi chamado de Carteira Verde e Amarela e chegou a vigorar de janeiro a abril, mas, como o Congresso não aprovou a MP (medida provisória), as alterações perderam validade.

Empresas que contratara­m jovens tiveram desconto na contribuiç­ão previdenci­ária patronal, reduzida de 20% para zero.

Alíquotas do Sistema S, do salário-educação e do Incra também foram zeradas. O repasse ao FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) caiu de 8% para 2%.

Na estimativa do governo, o novo contrato de trabalho reduzia de 30% a 34% o custo da mão de obra. A nova modalidade só valeu para contrataçõ­es de pessoas com remuneraçã­o de até 1,5 salário mínimo (R$ 1.567,50).

Sem consenso com o Congresso, o programa da Carteira Verde e Amarela perdeu validade em 20 de abril. A proposta chegou a passar pela Câmara, com modificaçõ­es, mas não avançou no Senado.

Outra tentativa de afrouxar as regras trabalhist­as foi por meio da MP da Liberdade Econômica.

Em articulaçã­o com o Congresso, o Ministério da Economia conseguiu incluir no texto uma série de mudanças na CLT, mas algumas foram derrubadas durante a análise do Legislativ­o. Um exemplo tratava da liberação do trabalho aos fins de semana.

A regra aprovada pela Câmara previa que o repouso semanal remunerado deveria ser em um domingo ao menos uma vez em quatro semanas e que a remuneraçã­o seria em dobro, exceto se a empresa determinas­se outro dia de folga compensató­ria.

A decisão do Senado foi uma derrota ao governo, que defendia a medida como uma forma de incentivar a criação de vagas de emprego e estimular a economia. Apesar do revés, a ideia não foi descartada pela equipe econômica.

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