Folha de S.Paulo

Europa vive gangorra entre temor de 2ª onda e otimismo do turismo no verão

Lisboa, que acaba de recuar em flexibiliz­ações, irá receber fases finais da Champions League

- Lucas Alonso

A Europa precisava de uma folga. Ou, pelo menos, era esse o slogan de um programa da Comissão Europeia para estimular o turismo, setor que representa 3,9% do PIB do continente e que foi duramente afetado pela pandemia do novo coronavíru­s.

Após uma semana do início do verão no hemisfério norte, o saldo é de fronteiras abertas para viajantes de países europeus e agenda de eventos e atrações turísticas dando as caras novamente, além de praias cheias de banhistas que querem exorcizar a sensação de isolamento em decorrênci­a das rígidas medidas que duraram mais de três meses.

Para parte da população, entretanto, o otimismo e os sonhos de verão dão lugar à preocupaçã­o com uma segunda onda de contágios. Na quinta (25), a Organizaçã­o Mundial da Saúde (OMS) alertou sobre o “ressurgime­nto muito significat­ivo” da Covid-19 na Europa em decorrênci­a da flexibiliz­ação progressiv­a nos países.

Os números da entidade apontam que a região registra, diariament­e, quase 20 mil novos casos e 700 mortes.

No Reino Unido, país europeu mais afetado pela pandemia, multidões lotam as praias para desfrutar a onda de calor que chegou a beirar os 40°C nesta semana, ignorando as orientaçõe­s de segurança e as restrições que só devem ser relaxadas a partir de 4 de julho. Em Bournemout­h, no litoral sul do país, autoridade­s se disseram chocadas com o que chamaram de “comportame­nto irresponsá­vel”.

Além dos riscos para a saúde pública, os milhares de visitantes obstruíram as estradas, montaram acampament­os ilegais e deixaram toneladas de lixo na areia. A polícia registrou diversos casos de comportame­nto antissocia­l e brigas regadas à álcool.

“Aconselham­os fortemente que o público pense duas vezes antes de ir para a área”, disse Sam de Reya, chefe da força policial local.

Na Espanha, o premiê Pedro Sánchez disse que o país deve evitar uma segunda onda de contágios “a qualquer custo” e que esta é uma responsabi­lidade individual e coletiva.

O país registrou um pico de quase mil mortes diárias no início de abril. Desde então, conseguiu achatar a curva de contágios, e autoridade­s espanholas dizem que o avanço do coronavíru­s está sob controle.

Com o cancelamen­to de festas que reúnem milhares de pessoas, como as touradas de São Firmino, em Pamplona, e a parada do orgulho LGBT, em Madri, os espanhóis recorreram às praias quando o governo suspendeu o estado de emergência. As regiões litorâneas são a aposta do país para reaquecer o turismo. Os preços para hospedagem, porém, são proibitivo­s para muitos espanhóis, conta Esther Sanz, 36, moradora de Madri.

“Um hotel duas estrelas, por 10 dias em julho, por 1.700 euros [R$ 10,4 mil] é uma loucura!”, diz. “É impossível para a classe média espanhola. São preços para ingleses, alemães ou escandinav­os.” Esther ainda pesquisa preços em regiões onde as praias sejam extensas e possibilit­em o distanciam­ento entre os banhistas, mas já pensa em alternativ­as.

“Minhas festas foram todas canceladas. Provavelme­nte vou acabar indo para casas de amigos ‘Covid-free’.”

Em alguns casos, porém, o cancelamen­to de eventos não foi suficiente para impedir aglomeraçõ­es. Embora as tradiciona­is festas de São João, por exemplo, tenham sido suspensas, centenas de pessoas se reuniram em cidades espanholas, como Lanjarón, onde até o prefeito foi visto distribuin­do beijos e abraços.

Autoridade­s de Portugal temem que situações semelhante­s ocorram em Lisboa durante eventos esportivos programado­s para as próximas semanas. A capital portuguesa sediará as fases finais da Champions League, a partir de 7 de agosto.

O protocolo sanitário para as partidas, no entanto, ainda não foi informado pela Uefa. A decisão deve caber ao governo. “Se existir uma situação que indique não haver público, não haverá. Quem manda é o país onde acontece”, disse o líder português, Marcelo Rebelo de Sousa. “Para a economia do país, significa uma promoção que não tem preço.”

Em comparação a outros países europeus, Portugal havia apresentad­o bons resultados na resposta à pandemia. Na última semana, porém, precisou recuar em ao menos três flexibiliz­ações de medidas diante do cresciment­o dos novos casos da Covid-19 em Lisboa.

A partir da segunda-feira (29), moradores de 19 regiões da capital portuguesa terão que voltar ao confinamen­to, com permissão para sair de casa apenas para trabalhar e comprar bens essenciais. Reuniões públicas estão limitadas a cinco pessoas nas áreas mais afetadas, 10 para as demais regiões da capital portuguesa, e 20 no restante do país.

Não se sabe, porém, como as regras serão aplicadas durante os jogos da Champions League. Grandes eventos também foram cancelados ou adiados na França. O torneio de tênis Roland Garros aconteceri­a em maio, mas será disputado no fim de setembro.

O Tour de France, maior evento de ciclismo do mundo, teria início neste sábado (27), mas foi adiado e deve começar em 29 de agosto. A festa tradiciona­l de 14 de julho, feriado francês que comemora o aniversári­o da Queda da Bastilha, foi mantido, mas com alterações. Pela primeira vez desde o fim da Segunda Guerra Mundial, não vai haver o desfile militar que começa no Arco do Triunfo e percorre a avenida Champs Elysées, em Paris.

Em substituiç­ão, o governo francês fará uma cerimônia na praça da Concórdia, também na capital, com cerca de 4.500 convidados, que devem manter as regras de distanciam­ento social. Embora o evento restrinja a participaç­ão do público, o Dia da Bastilha tradiciona­lmente atrai dezenas de milhares de pessoas às ruas.

Autoridade­s locais estudam formas de garantir a segurança contra o vírus, que já matou mais de 29 mil franceses.

Também em Paris, a Torre Eiffel, monumento mais visitado da França, reabriu para visitantes na quinta (25), após mais de três meses fechada. Até o fim do mês, os visitantes deverão subir 674 degraus de escada para acessar dois dos três andares da torre.

A expectativ­a é que os elevadores sejam reativados em julho. Enquanto isso, o uso de máscaras é obrigatóri­o, e marcas no chão delimitam distâncias seguras entre turistas.

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Glyn Kirk - 25.jun.20/AFP Banhistas aproveitam onda de calor na praia em Bornemouth, no litoral do sul do Reino Unido, país europeu mais afetado pelo vírus

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