Folha de S.Paulo

Sim Sinal de maturidade e responsabi­lidade

Novas medidas deverão recuperar o equilíbrio fiscal

- Ana Paula Vescovi Economista-chefe do Santander Brazil, ex-secretária do Tesouro Nacional (2016-18) e ex-secretária­executiva do Ministério da Fazenda (2018)

O Brasil será um país mais justo, menos desigual e mais responsáve­l com as próximas gerações após a aprovação da reforma da Previdênci­a. Mas ainda permanecer­á com muitas restrições para crescer mais e de modo mais sustentáve­l.

Sem dúvida trata-se de um passo histórico e muito importante. Revela o que podemos produzir de melhor nas discussões entre a sociedade, o Congresso e o governo federal. Uma obra de muitos, a maior parte anônima ou desconheci­da. Quem imaginaria ver centenas de milhares de brasileiro­s indo às ruas, chamando seus representa­ntes à responsabi­lidade pela reforma da Previdênci­a, para que o Brasil pudesse se afastar da beira do abismo econômico e social?

Foram três anos de discussões, o que assegurou maior acúmulo de informaçõe­s, maior transparên­cia e maturidade no enfrentame­nto da reforma do Estado brasileiro —que apenas se inicia.

A nova Previdênci­a se soma a um rol de diversas outras medidas que têm sido aprovadas no intuito de retirar o Brasil da mais profunda crise da sua história e visa adaptar o país às aceleradas mudanças demográfic­as. Em particular, evitará um colapso fiscal e assegurará condição necessária, ainda que não suficiente, para reaver o equilíbrio fiscal que começamos a perder desde 2013. Representa uma redução da despoupanç­a do governo de 9% do PIB em 30 anos, o que permite a convivênci­a imediata com taxas de juros estrutural­mente mais baixas.

Para reavermos o equilíbrio fiscal será preciso estender as novas regras previdenci­árias para estados e municípios, conferindo-lhes instrument­os para conter despesas obrigatóri­as ao longo do tempo e liberar recursos para investimen­tos em infraestru­tura e para programas sociais, como saúde, educação e segurança. Ou seja, para liberar mais recursos em benefício da população.

Será preciso rever o desenho das carreiras e instituir remuneraçã­o por mérito, demissão por insuficiên­cia de desempenho e regular greve no serviço público. Com isso, além de racionaliz­ação das despesas com servidores —aproximand­o-os dos trabalhado­res da iniciativa privada— será possível melhorar a alocação dos impostos recolhidos e aumentar a produtivid­ade no setor público (40% do PIB).

Há retrocesso­s no meio do caminho, como o projeto que trata da extensão para estados e municípios das novas regras da Previdênci­a para militares. Novamente incorrese no erro de impor custos aos entes subnaciona­is, que, em diversos casos, já haviam estabeleci­dos regras próprias de contribuiç­ões e de benefícios na inatividad­e. Cada um deve saber o tamanho do seu bolso.

Outras reformas ainda serão necessária­s, como a revisão de benefícios fiscais, a desvincula­ção de receitas e a desindexaç­ão de gastos.

Mas a reforma previdenci­ária já contribui para melhorar a alocação intertempo­ral da despesa pública e para retirar dos jovens a imensa sobrecarga de uma dívida pública elevada e crescente, impulsiona­da por despesas correntes.

Há motivos para avaliações construtiv­as. A sociedade demonstra a intenção de empreender reformas para trazer o Estado brasileiro ao tamanho condizente com o pagamento de impostos, bem como de promover instituiçõ­es inclusivas e ambiente de negócios capazes de fazer o desenvolvi­mento do país sair do campo das promessas.

A agenda é extensa e complexa, mas um desafio à altura da maior maturidade social no Brasil.

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