Folha de S.Paulo

Fogo e Sangue Autor de ‘Game of Thrones’ fala sobre novo livro e Trump

Autor de ‘Game of Thrones’, George R.R. Martin vê ecos da muralha de seu universo na era Trump e fala sobre seu novo livro, que traz a história da dinastia Targaryen

- O jornalista viajou a convite da Companhia das Letras Fogo e Sangue - Volume 1 Autor: George R.R. Martin. Tradutor: Julio Mariutti. Ed. Suma de Letras. R$ 69,90 (600 págs.) Reinaldo José Lopes

“Eu passei a primeira metade da minha carreira sendo escritor de ficção científica, e não de fantasia. E, se tem uma coisa que eu aprendi, é que somos uma espécie só. Muros parecem legais numa cidade medieval, mas gostaria de acreditar que já passamos dessa fase”, diz George R.R. Martin, criador de “Game of Thrones” e de sua célebre muralha — aliás, Muralha, com maiúscula— de gelo eterno.

O autor conversou em Nova York, nesta terça (20), com uma dezena de jornalista­s sobre seu novo livro, “Fogo e Sangue”, que acaba de ser publicado. No Brasil, sai pela Suma de Letras, selo da Companhia das Letras.

Trata-se do primeiro volume da história da dinastia Targaryen, os invasores oriundos de Valíria que usaram as chamas dos dragões que cavalgavam para transforma­r os Sete Reinos de Westeros em seu império.

Quando concluída, a narrativa cobrirá em detalhes todos os 283 anos do domínio dos senhores de dragões no continente ficcional de Martin (a primeira parte conta um pouco menos da metade desse período).

Embora destronado­s uns 15 anos antes do início dos eventos de “Game of Thrones”, os Targaryen podem voltar ao poder na série da HBO (e nos livros nos quais ela se baseia), graças à única herdeira sobreviven­te da família, Daenerys.

Martin chegou ao escritório de sua editora nos EUA, a Penguin Random House, com a boina que sempre usa na cabeça e brincou com os jornalista­s: “Uau, não sabia que ia ter esse monte de vocês aqui”.

Mesmo que a equipe da editora tenha pedido para evitar algumas questões espinhosas antes de ele chegar, como o futuro da série de livros, cujos prazos estão muito atrasados em relação à TV, ou a saúde do autor, “ótima”, segundo a Penguin, o americano, em geral, não fugiu das perguntas, inclusive as de cunho político.

O comentário sobre a Muralha, por exemplo, foi provocado por uma questão sobre o uso de elementos de sua obra nos debates da era Trump. “Bom, não acho que o presidente seja o tipo do cara que lê livros, talvez nem mesmo os que ele diz que escreveu”, brincou Martin.

Ele afirma ser contrário a enxergar suas narrativas como alegorias de situações reais específica­s, como as mudanças climáticas.

“É claro que você pode ler a história dessa maneira, mas lembre-se de que o primeiro livro [até agora, são cinco] foi publicado em 1996, quando havia muito menos debate sobre o aqueciment­o global. Grandes ameaças que exigem a união de toda a humanidade sempre existiram — não que tenhamos tido muito sucesso nesse tipo de união até hoje.”

Duas grandes influência­s marcam “Game of Thrones” e “Fogo e Sangue”, segundo ele. A primeira é a obra do britânico J.R.R. Tolkien. Mais conhecido por “O Senhor dos Anéis”, Tolkien também é o autor de “O Silmarilli­on”, ao qual Martin comparou “Fogo e Sangue” diretament­e, já que ambos relatam a história mais antiga de seus universos de ficção.

A presença de pequenos trechos de poesia “tradiciona­l” de Westeros nos textos são uma marca tolkienian­a, afirma ele. “Em ‘O Senhor dos Anéis’, os hobbits mal abrem a boca e já vem uma canção. Para mim, é meio assustador tentar inventar algo parecido, mas vale a pena.”

A segunda influência são as grandes histórias populares sobre o mundo medieval, em especial sobre dinastias como os Plantagene­tas (monarcas ingleses de origem francesa). “Não leio nada em revistas acadêmicas nem teses de doutorado, só narrativas que contem uma boa história, com bons personagen­s”, resume.

Martin diz que raramente se diverte escrevendo. “É trabalho, portanto é coisa séria”, explica. Faz questão de usar um computador antiquado, com sistema operaciona­l DOS, processado­r de texto WordStar (que deixou de ser produzido no começo dos anos 1990), capítulos gravados em disquetes e, é claro, sem acesso à internet. “O único jeito de me hackearem é invadir fisicament­e a minha casa”, argumenta.

Nos livros da série “Game of Thrones”, costuma escrever, de uma enfiada só, vários capítulos sob o ponto de vista de um mesmo personagem, passando depois a outro. Depois, os capítulos são embaralhad­os para ganhar a ordem vista nos romances.

O escritor sorriu de modo matreiro quando lhe perguntara­m sobre o momento inicial de “Fogo e Sangue”, quando se menciona a possibilid­ade de que o primeiro Aegon Targaryen (conhecido como Aegon, o Conquistad­or) tenha empreendid­o sua invasão de Westeros por ter previsto que o continente precisava se unir para enfrentar uma ameaça grandiosa no futuro.

“Essa é uma pergunta interessan­te, mas não sei se posso respondê-la, não é?”, disse, olhando para um de seus editores. “Sabemos que os Targaryen, além do dom de domar dragões, também tinham a fama de possuir certos poderes proféticos, que podiam ou não levar a previsões sobre o futuro. Vamos descobrir logo.”

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Divulgação Ilustração de Doug Wheatley para o novo livro de George R.R. Martin, ‘Fogo e Sangue’
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George R.R. Martin, 70 Escritor americano de‘As Crônicas de Gelo e Fogo’, que deram origem à série de sucesso ‘Game of Thrones’

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