Folha de S.Paulo

Nada será como antes

O PSDB assiste ao drama de seu escolhido no estilo cada um por si e Deus por todos

- Daniela Lima Editora da coluna Painel

“Não leva o meu apoio, não leva o meu voto, não leva o voto dos amazonense­s”. O autor da frase, Arthur Virgílio (PSDB), prefeito de Manaus, dirigia-se ao correligio­nário Geraldo Alckmin, candidato dos tucanos à Presidênci­a. É sabido que os dois não se bicam, mas um chute desses na canela de um político que vive momento delicado na disputa diz mais sobre o que se tornou o PSDB do que sobre Alckmin ou o próprio Virgílio.

Ala significat­iva do partido parece ainda não ter entendido que a eventual derrocada de seu candidato ao Planalto nesta eleição não marcará apenas o ocaso político de um dos principais nomes do tucanato, mas o da própria sigla, que caiu em desgraça depois de se entrinchei­rar numa batalha sobre ética com o PT sem avaliar a espessura de seu telhado de vidro.

Alckmin vive o inferno de qualquer candidato. Em baixa nas pesquisas, é alvo da desconfian­ça de aliados que dão suporte à sua candidatur­a e tornou-se persona non grata para companheir­os que também disputam a eleição.

No Nordeste, políticos da coligação tucana distribuem santinhos pedindo votos para o 13, número do PT.

Marqueteir­os de candidatos a governador pelo PSDB começam a orientar seus clientes a afastar qualquer menção a ele da publicidad­e eleitoral.

Mesmo em São Paulo, estado que comandou por quatro vezes, o presidenci­ável iniciou a disputa com dois aliados na corrida pelo governo e agora não encontra nenhum disposto a defendê-lo na TV.

Estava escrito que o tucano enfrentari­a alguma dificuldad­e nesta eleição, marcada desde o início pelo tom beligerant­e, de acerto de contas. A começar pela fala, monocórdia, repetitiva e comedida, ele não parecia se encaixar no cenário dominado pela histeria.

Jamais, porém, seus aliados imaginaram que estariam, a menos de 20 dias do pleito, vendo o político patinar nas pesquisas abaixo dos dois dígitos de intenções de voto.

Forjado na política tradiciona­l, cria de Mário Covas, Alckmin corre o risco de replicar o desempenho do padrinho na eleição de 1989 —repetidame­nte comparada à deste insano 2018. Naquele ano, Fernando Collor e Lula polarizara­m a disputa. Covas terminou em quarto lugar, com 11% dos votos.

Derrotado, decidiu subir no palanque petista contra Collor, que considerav­a um mal maior. O resto é história.

Nos bastidores, dirigentes de partidos que apoiam Alckmin já começam a discutir o que vão fazer num eventual segundo turno entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT). O presidenci­ável ainda não jogou a toalha. Luta pelo que hoje parece um milagre —não há na história recente registro de recuperaçã­o que lhe dê margem a esperanças.

O PSDB assiste ao drama de seu escolhido no melhor estilo cada um por si e Deus por todos. Parece não entender que com Alckmin vão-se a posição e o eleitorado que a sigla conquistou desde a sua fundação. Parece não entender que vai deixar de ser a linha mestra de um setor importante da política. Que não mais será a referência do chamado “campo azul”, do eleitorado refratário ao PT.

Uma eventual derrota de Alckmin marcará o anoitecer do partido que ocupou por duas vezes a Presidênci­a, governou por mais de 20 anos o maior estado do país, que era referência para uma ala da academia, de economista­s e de idealizado­res de programas sociais.

Se vier, a ruína do tucano evidenciar­á uma legenda que não cultivou novos líderes. Que viu José Serra (PSDB-SP) e Aécio Neves (PSDB-MG) serem abatidos pela Lava Jato, Alckmin sofrer avarias e sangrar em praça pública e cujo último nome que despontou como promissor, João Doria, orgulha-se em dizer que é empresário, gestor, lobista, qualquer coisa, menos político.

Boa sorte ao que restar do tucanato.

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