Folha de S.Paulo

Psicólogo a bordo e terapias em grupo ajudam a combater medo de dirigir

Tratamento­s ajudam motoristas que têm crises de ansiedade ou sofreram acidentes a encarar o volante de novo

- Dante Ferrasoli Karime Xavier / Folhapress

Os motivos que levam alguém a ter medo de dirigir podem ser variados: trauma após acidente, dificuldad­e de parar em subidas ou receio de atrapalhar o trânsito, por exemplo. O perfil de quem procura ajuda, porém, costuma ter algo em comum.

“Quase todos os clientes são ansiosos e não admitem errar”, afirma Helena Santos, neuropsicó­loga da clínica-escola Assertivit­à, que atende a motoristas com receio de assumir o volante.

O ansioso, ela explica, antecipa os problemas do futuro. “Eles pensam que estacionar vai ser difícil e aí não dirigem porque não querem enfrentar a situação”, diz.

“São pessoas inteligent­es, sensíveis, humanas, mas que não gostam de críticas”, afirma a psicóloga Neuza Corassa, diretora do CPEM (Centro de Psicologia Especializ­ada em Medos) e autora do livro “Vença o Medo de Dirigir” (Editora Gente, 2006).

A clínica-escola em que Helena trabalha oferece, além de aulas ao volante, sessão de terapia em grupo a cada 15 dias.

O profission­al de marketing digital Marco Gronchi, 27, frequenta as sessões desde janeiro. A princípio, ele achava que seu medo de dirigir era falta de prática e se cobrava bastante. “Eu pensava ‘estou atrapalhan­do tudo, o cara que está buzinando é melhor que eu’”, conta.

Ele tentou aulas convencion­ais para habilitado­s, mas não adiantou. Aí percebeu que precisava de ajuda psicológic­a.

“No começo não punha muita fé nas sessões, mas é muito bom você ouvir pessoas que têm o mesmo problema”, afirma ele, que está a um mês de acabar o tratamento e diz já dirigir quase normalment­e.

Para Neuza, do CPEM, medos não são ruins em si.

“O medo é bom, é nosso aliado, nos avisa para ter cuidado. O problema é quando se torna uma fobia que limita a vida da pessoa”, afirma.

Quem precisa dirigir por necessidad­e não pode ter a vida limitada pelo temor.

A terapeuta Juliani Rodrigues, 38, mora em São Bernardo do Campo (Grande São Paulo) e trabalha na Vila Olímpia (zona sul). Para ela, o carro tornou-se fundamenta­l nos seus deslocamen­tos diários.

Ela só tirou a habilitaçã­o aos 34, quando se separou. Com a carteira, veio a inseguranç­a.

“Tinha medo de parar o trânsito, de atrapalhar as pessoas”, conta. Primeiro, procurou a ajuda de amigos, o que não deu certo. “Iam comigo no carro e diziam ‘nossa, quase bateu!’, ‘nossa, como que você conseguiu a carta?’”, relembra.

Juliani iniciou uma terapia chamada thetaheali­ng, que tenta, via espiritual­idade e ciência, mudar crenças negativas —ligadas ou não à direção. “Na terapia descobri qual era o medo que me paralisava, comecei a liberá-lo e a segurança foi voltando”, diz.

Ela também treinou a parte prática da direção numa autoescola para habilitado­s cujas aulas são acompanhad­as por psicóloga a bordo. Combinando as duas coisas, superou a fobia e vai trabalhar de carro todos os dias.

Há ainda quem pare de dirigir após um trauma, mas precise voltar a fazê-lo.

A operadora de telemarket­ing Aline Lázaro, 31, dirigia até 2015, quando sofreu um acidente com o pai. Ninguém se feriu, mas ela não quis mais guiar. Três anos depois, tem de voltar ao volante.

O pai morreu no início do ano e o namorado amputou a perna. A mãe já teve seis AVCs. “Precisavam de mim, eu tinha que voltar a dirigir”, diz.

Aline começou a fazer aulas de direção com acompanham­ento psicológic­o há cerca de um mês. “Eles me orientam levando em conta a história do trauma. Devagar, comecei a perder o medo”, diz ela, ainda no começo do tratamento.

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A terapeuta Juliana Rodrigues, 31, na garagem de casa, em São Bernardo do Campo
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Keiny Andrade/Folhapress O profission­al de marketing digital Marcos Gronchi, 27, em São Paulo

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