Folha de S.Paulo

Análise Mauro Paulino e Alessandro Janoni

- Mauro Paulino e Alessandro Janoni Diretor-geral e diretor de Pesquisas do Datafolha

Estratégia de petista alimenta também seu antagonist­a

O saldo dos últimos acontecime­ntos no cenário eleitoral mexeu com o imaginário da opinião pública. O registro da candidatur­a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e principalm­ente sua repercussã­o, despertam parte importante do eleitorado, que, nos últimos meses, com sua prisão, mostrava-se letárgica.

No entanto, se a estratégia petista parece ter revigorado a esperança de parcela de seus simpatizan­tes, por outro pode cristaliza­r a figura de seu antagonist­a —Jair Bolsonaro (PSL) tem vantagem sobre Marina Silva (Rede) fora da margem de erro, em simulação sem Lula.

A ex-ministra fica isolada na segunda colocação e deixa para trás Ciro Gomes (PDT), que briga com Geraldo Alckmin (PSDB) pelo terceiro lugar.

Haddad (PT), virtual substituto de Lula, fica no pelotão de baixo, com 4%, mesmo percentual obtido por Alvaro Dias (Pode).

O imbróglio gera ruído em uma campanha de “tiro curto”, com pouco espaço para manobras arriscadas, especialme­nte numa eleição em que o desinteres­se é o mais alto desde 1994.

A evolução da intenção de voto espontânea, sem estímulos dos nomes dos candidatos, fornece o diagnóstic­o claro. Nessa situação, menções ao ex-presidente vinham caindo gradativam­ente desde a sua prisão em abril.

Agora, com o registro de sua candidatur­a, as citações cresceram dez pontos percentuai­s, principalm­ente nos segmentos que historicam­ente o apoiam, como os menos escolariza­dos, de menor renda e moradores do Nordeste.

Mas Bolsonaro também subiu. E com padrão mais intenso do que o observado em oscilações anteriores —três pontos nos últimos dois meses e cinco pontos, se considerad­as as pesquisas feitas desde janeiro. De junho até aqui, seu cresciment­o na espontânea é mais nítido especialme­nte na Região Sul.

Cruzando-se os dados de intenção de voto por grupos de apoio e rejeição ao ex-presidente, percebe-se a força do candidato do PSL ao personific­ar o “anti-Lula”.

No estrato que rejeita totalmente o petista, não só como candidato, mas também como cabo eleitoral, Bolsonaro alcança praticamen­te o dobro das intenções de voto que tem na média do eleitorado (42%). Alckmin, nesse conjunto, fica com até 11%, empatado com Marina.

Com essas mudanças, mesmo mantendo-se recorde em comparação a eleições anteriores, em período equivalent­e, a vontade de votar em branco ou anular o voto caiu nove pontos percentuai­s.

Defendem a posição espontanea­mente 14% dos brasileiro­s. Na estimulada, com a apresentaç­ão dos nomes e sem Lula, o índice vai a 22%. Em agosto de 2014, esses índices correspond­iam a 6% e 7%, respectiva­mente.

O desafio do PT será, caso se confirme a inelegibil­idade de Lula, conseguir comunicar a tempo a candidatur­a de Fernando Haddad e o quanto ela representa de fato um substituto do ex-presidente.

Haddad chega a ser menos conhecido entre os lulistas fiéis do que entre seus detratores. Quase metade dos que enaltecem o ex-presidente, tanto como candidato quanto como cabo eleitoral, não sabe quem é Haddad, mesmo que só de ouvir falar.

Consideran­do-se o perfil desse estrato (baixas escolarida­de e renda) e o revés eleitoral recente de Haddad em segmento correspond­ente em São Paulo, a tarefa dos petistas fica ainda mais árdua, pois agrega a preocupaçã­o de não alimentar um “anti”, como o fez em sua tentativa de reeleição na capital paulista.

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