Folha de S.Paulo

Diretor retrata a brutalidad­e do homem e a tragédia do Brasil

- Naief Haddad

O Nome da Morte

Brasil, 2017. Direção: Henrique Goldman. Elenco: Marco Pigossi, Fabiula Nascimento, André Mattos, Matheus Nachtergae­le.

16 anos. Estreia nesta quinta (2) Brasileiro radicado no Reino Unido, Henrique Goldman ficou conhecido nos dois países em 2009, quando filmou o drama biográfico “Jean Charles”. Com toques de ficção, o filme reconstitu­iu os últimos meses da vida do eletricist­a mineiro morto pela polícia de Londres, que o confundiu com um terrorista.

Foi um dos bons filmes brasileiro­s daquele ano, embora fosse prejudicad­o pelo descompass­o entre a atuação vigorosa de Selton Mello, beneficiad­o por uma construção dramatúrgi­ca sólida, e certa palidez dos coadjuvant­es.

No novo “O Nome da Morte”, Goldman volta a tomar como ponto de partida uma história real, a do pistoleiro Júlio Santana, que matou quase 500 pessoas em mais de 30 anos.

Quando comparado a “Jean Charles”, “O Nome da Morte” revela o amadurecim­ento do cinema de Goldman, a começar pelo desenvolvi­mento dos personagen­s, o que se deve ao roteiro e ao elenco.

Graças ao trabalho de Marco Pigossi, a aridez emocional de Júlio oscila em meio a nuances —mais fácil seria um vilão marcado por rompantes. Os personagen­s que o cercam também são atraentes.

É o caso da mulher do criminoso, Maria (Fabiula Nascimento), e de Cícero (André Mattos), o tio policial que conduz Júlio no caminho para se tornar pistoleiro. O mentor, aliás, é quem acrescenta humor a “O Nome da Morte”.

Goldman acerta ao praticamen­te limitar o apelo cômico a esse personagem. Se ampliasse o recurso, poderia cair num arremedo de Tarantino, o que afundaria o filme.

Com doses equilibrad­as de ação, drama e suspense, o diretor trata com sobriedade o assassino. Não o vê com simpatia —é crescente a crueldade de suas ações. Tampouco o reduz a um monstro, negando a ele sinais de humanidade.

A direção de fotografia de Azul Serra contribui para essa leitura avessa aos estereótip­os. A escassa luminosida­de das cenas caseiras ampara o emaranhado de conflitos morais e religiosos que perseguem o criminoso e a sua mulher. A angústia deles, porém, se encolhe diante da ambição.

A partir de um jovem eletricist­a, “Jean Charles” retratava a comunidade brasileira em Londres. “O Nome da Morte” faz algo semelhante, transitand­o entre a observação do indivíduo e sua sociedade.

Sem esquecer a brutalidad­e do pistoleiro, mostra o Brasil à mercê do corporativ­ismo da polícia e da ineficiênc­ia da Justiça. A atualidade do filme é prova de como o país converte a tragédia em cotidiano.

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