Folha de S.Paulo

Esquerda e o fantasma da corrupção

É o maior desafio para o novo presidente mexicano

- Clóvis Rossi Repórter especial, membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot

Andrés Manuel López Obrador, presidente eleito do México, terá pela frente, além dos problemas habituais de qualquer governante, dois desafios com os quais a esquerda não demonstrou, até agora, saber lidar: corrupção e criminalid­ade.

No caso de AMLO, como é comumente chamado, o desafio se torna ainda mais poderoso porque ele fez da limpeza na gestão pública o seu cântico mais poderoso para se eleger.

Corrupção no México é um problema bastante antigo. No macro e no micro: sempre se falou da “mordida”, como os mexicanos tratam, por exemplo, aquele suborno ao policial para não serem multados por uma infração de trânsito.

No macro, o México é considerad­o o sexto país mais corrupto nas Américas, o que é dizer muito quando se sabe que o Brasil ainda faz parte das Américas, em ranking do Fórum Econômico Mundial.

Mas, no da Transparên­cia Internacio­nal, é o 135º entre 168 países, pior até do que o Brasil, que fica em 96º.

O que complica ainda mais o problema para o novo presidente é que ele, durante a campanha, deu a entender que a corrupção é a mãe de todos os problemas, inclusive das desigualda­des sociais, outra ferida aberta no México, como em toda a América Latina.

AMLO é geralmente considerad­o um político honesto, até mesmo pela maioria de seus adversário­s e críticos. E parece acreditar que o exemplo de honestidad­e vindo de cima (da Presidênci­a) bastará para inibira corrupção nos níveis inferiores do governo.

Duvido que baste para limpar o México. O exemplo do Brasil é eloquente a respeito: o PT era considerad­o um partido livre de corrupção até chegar ao poder federal (houve escândalos menores em governos municipais antes disso, mas nada que se equiparass­e aos de outros governos/partidos).

Com Lula na Presidênci­a, no entanto, desandou. Ou, como prefere um dos cardeais do próprio PT, Jacques Wagner, o partido “se lambuzou”. Outro petista graúdo, hoje fora do partido, Antonio Palocci, foi além: disse que Lula fez um “pacto de sangue” coma Odebrecht—empre saques e tornou símbolo da corrupção em toda a América Latina.

Além dessas confissões saídas das entranhas do petismo, vale também a análise para a Nueva Sociedad, revista editada pela social-democracia alemã, feita por Massimo Modonesi, historiado­r e sociólogo.

Sua simpatia pela esquerda fica evidente no fato de ser diretor da revista do Centro de Estudos do Movimento Operário e Socialista do México

Após festejara vitória de AM LO, Modonesi escreve que e lese diferencia dos “governos progressis­tas latino-americanos das últimas décadas por sua insistênci­a na questão moral”. E completa: “Justo na que muitos desses governos naufragara­m”.

AMLO não tem o direito de naufragar também nesse quesito, pela centralida­de que deu a ele na campanha.

Mas faltam informaçõe­s sobre como enfrentará a questão em que “se lambuzaram” seus pares de esquerda na América Latina.

Da mesma forma, no enfrentame­nto da violência, não há detalhes sobre o que fará o novo presidente. É outro ponto vital quando se sabe que 76,8% dos mexicanos, segundo pesquisa do Instituto Nacional de Segurança e Estatístic­a, se sentem inseguros em suas cidades.

Governos de esquerda na região tampouco conseguira­m equacionar­es se tremendo problema.

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