Folha de S.Paulo

Procurador­ia denuncia 62 acusados de operar propina

- -Italo Nogueira

A denúncia contra 62 operadores financeiro­s acusados de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e organizaçã­o criminosa apresentad­a na quarta-feira (6) pelo Ministério Público Federal descreve em detalhes o caminho percorrido pelo dinheiro.

Os procurador­es apontam no documento o “ciclo completo” da propina supostamen­te paga pela construtor­a Queiroz Galvão ao ex-governador Sérgio Cabral (MDB), também alvo. A denúncia foi antecipada pelo Painel.

O processo envolveu dinheiro vivo recolhido no comércio popular da rua 25 de março em São Paulo, depósitos em bancos no exterior, o envolvimen­to de três grupos de operadores até chegar às mãos de Renato e Marcelo Chebar, doleiros do emedebista.

À exceção de Cabral, todos os denunciado­s são doleiros e operadores financeiro­s que fizeram parte de uma das pontas do complexo sistema de operação de Vinicius Claret e Cláudio Barboza, funcionári­os do maior doleiro do país, Dario Messer, foragido.

A delação da dupla foi a origem da Operação Câmbio, Desligo, cuja investigaç­ão culminou na acusação.

Um dos acusados foi o doleiro Raul Davies. Segundo as investigaç­ões, ele procurou a dupla em julho de 2011 ao ser contratado pela Queiroz Galvão para viabilizar o pagamento de propina a Cabral. Para isso, precisava obter dinheiro em espécie no Brasil.

Os funcionári­os de Messer pediram a Davies depósito em duas contas num banco da Coreia do Sul, em nome das offshores Chiefrun Limited e Main Future Limited.

Ambas haviam sido anteriorme­nte indicadas por Chaaya Mograbi, operador financeiro de lojas da 25 de março, segundo os delatores.

Ele fornecia a Claret e Barboza dinheiro vivo obtido no comércio popular em troca dos depósitos no exterior — neste caso, executados por Davies. Os valores em espécie foram, então, repassados a Davies que, por sua vez, os encaminhar­am a Cabral.

Esta operação (chamada dólar-cabo), em 4 de julho, movimentou R$ 635 mil. O Ministério Público Federal afirma que os mesmos personagen­s atuaram juntos em outras sete oportunida­des, envolvendo bancos na Coreia, Panamá, Hong Kong e China.

A operação Davies-Mograbi somou R$ 6,6 milhões sem que eles sequer soubessem, necessaria­mente, da atuação um do outro.

Davies teria repassado, no total, R$ 24 milhões a Cabral (por meio dos irmãos Chebar) em nome da Queiroz Galvão.

Os próprios irmãos Chebar também recorriam a Claret e Barboza para enviar esses mesmos recursos para o exterior, o que fazia girar o “moinho” do sistema dos funcionári­os de Messer.

O ex-governador é o único cliente final descrito na denúncia. Os demais acusados são operadores cujos clientes, se descoberto­s, dão o “potencial explosivo” conferido à investigaç­ão pelo procurador Eduardo El Hage, coordenado­r da Lava Jato no Rio. Serão os próximos passos da investigaç­ão.

Os dois funcionári­os de Messer entregaram ao Ministério Público Federal os arquivos do sistema Bankdrop, no qual reuniam informaçõe­s de doleiros de todo o país que movimentar­am cerca de US$ 1,6 bilhão (cerca de R$ 5,3 bilhões) entre 2009 e 2017, envolvendo mais de 3.000 offshores em 52 países.

Contando com a ampla rede de contatos de Messer, a dupla casava operações de venda de dólares com compra de reais de diferentes clientes.

Assim, aqueles interessad­os em transforma­r recursos depositado­s no exterior em dinheiro vivo no Brasil buscavam Claret e Barboza, que localizava­m alguém que quisesse fazer a operação inversa.

Deflagrada em 3 de maio, a Operação Câmbio Desligo prendeu 44 pessoas, entre elas Davies, detido no Uruguai. Outras nove ainda estão foragidas, como Mograbi e Messer.

O advogado Antônio Pitombo, que defende Raul Davies, negou as acusações. “A defesa de Raul e Jorge Davies [também preso e denunciado] manifesta a indignação com o oferecimen­to da denúncia sem lastro em fato, sem prova e sem mínimos indícios de autoria. Aguarda que Justiça imparcial pesquise a verdade e os absolva da acusação.”

Cabral e a Queiroz Galvão não comentaram.

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Investigaç­ão detalha esquema de corrupção entre doleiros, empresas e políticos

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