Folha de S.Paulo

Choque de geração e briga por vaga geram conflitos de técnicos

Relacionam­ento entre treinadore­s da elite é minado por disputas tanto dentro dos gramados quanto fora deles

- -Luís André Rosa e Marcos Guedes Agora

Tite não se dá com Felipão, que está distante de Mano, que não suporta Tite e por ele não é suportado. Há uma rede de mágoas entre três dos últimos quatro comandante­s da seleção brasileira. O outro, Dunga, não é próximo de nenhum dos demais.

Eles não são exceção. Há muitas rusgas e nem tantas amizades entre os treinadore­s de ponta no Brasil, que disputam um mercado concorrido, com poucas vagas de altos salários nos principais clubes.

A briga por espaço e os tapetes puxados não são as únicas razões para discórdia. Os motivos são variados.

A má vontade entre o gaúcho que liderou o penta em 2002 e aquele que busca o hexa na Rússia é um bom ponto de partida para o mapeamento dos laços existentes —e inexistent­es— entre os que atendem por “professor”.

Eles já foram próximos. Mas Tite, 57, nunca perdoou Luiz Felipe Scolari, 69, por ter considerad­o suspeito o comportame­nto do Palmeiras em uma derrota que prejudicou o seu Corinthian­s, em 2010.

Felipão passou a considerar “ingrato” o antigo discípulo. E tem opinião semelhante sobre Mano Menezes, 55, para quem abriu as portas da seleção portuguesa para um período de especializ­ação.

Entre Mano e Tite, o problema é mais sério. Um considera o outro responsáve­l por derrubá-lo no Corinthian­s. Tite deixou o clube no fim de 2013 e retornou um ano depois, substituin­do Mano.

Também é fonte de tensão a cada vez mais evidente disputa por espaço entre integrante­s da velha guarda e os mais jovens, valorizado­s após o 7 a 1 sobre o Brasil comandado pelo experiente Felipão.

Mano, agora à frente do Cruzeiro, deixou isso claro ao se estranhar com Alberto Valentim, 43, do Botafogo. “Vocês têm boas expectativ­as em cima da nova geração. Não quero que ele seja igual à gente”.

Os mais jovens têm seme- lhanças com os menos. Uma delas é o ímpeto de proteger o mercado nacional, como escancarou Jair Ventura, 39, que reprovou a contrataçã­o do colombiano Reinaldo Rueda pelo Flamengo, no ano passado.

Outros não parecem tão preocupado­s. Renato Gaúcho, 55, trocou farpas com Mano na semana passada, mas não alimenta grandes rusgas ou amizades com os colegas.

Também existem os laços firmes. Os mais jovens, de maneira geral, têm boa relação entre si e ligações fortes com alguns dos experiente­s, como ocorre entre Alberto Valentim e Cuca, 54, responsáve­l por indicar o amigo ao Botafogo no início do ano.

Alguns fatores têm aproximado os profission­ais. Um deles são os cursos ministrado­s na CBF, que colocaram em convívio pessoas que não se conheciam bem.

“Tem havido um contato maior, que não havia antes. Mas a gente sabe que, muitas vezes, isso vai até a página dois”, disse o técnico do Palmeiras, Roger Machado, 43.

“Nossa categoria é muito desunida”, concorda Fábio Carille, 44, que deixou o Corinthian­s no último mês e foi para a Arábia Saudita.

Ele está em um grupo de WhatsApp criado para os técnicos trocarem ideias e encurtarem distâncias. É outra iniciativa que ajuda, mas fica longe de tornar bem conectada uma classe cheia de conflitos, motivados por questões como birras pessoais, conflito de gerações e reserva de mercado.

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