Folha de S.Paulo

Economista rebate esquerda e ortodoxos com crítica a Dilma

Ex-presidente adotou estratégia desastrosa ao assumir poder, diz Laura Carvalho

- Ricardo Balthazar

Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico

Laura Carvalho. Editora Todavia. R$ 49,90, 192 págs.

Dois anos depois do impeachmen­t de Dilma Rousseff (PT) e com a economia se recuperand­o lentamente da recessão em que afundou durante seu governo, a esquerda ainda encontra dificuldad­es para entender o que deu errado. Para a economista Laura Carvalho, chegou a hora de pôr a colher na discussão.

Aos 34 anos, professora da Faculdade de Economia e Administra­ção da USP (Universida­de de São Paulo) e colunista da Folha desde 2015, Laura é uma voz emergente na esquerda e tem visão mais crítica do que a de muitos dos seus colegas no campo heterodoxo.

Em “Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico”, seu primeiro livro, ela descreve o zigue-zague da política econômica brasileira nos últimos anos como uma sequência de passos de dança desajeitad­os, que teriam feito o país avançar para depois andar de lado e, finalmente, retroceder.

Laura acha que as coisas começaram a dar errado com a posse de Dilma, em 2011, e o abandono de políticas que tinham produzido bons resultados nos dois mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de 2003 a 2010.

Em vez de estimular o mercado interno com crédito e investimen­tos públicos, afirma Laura, a presidente recémeleit­a preferiu reduzir impostos e oferecer subsídios à indústria, na esperança de que assim conseguiri­a fazer o setor privado investir e acelerar os motores da economia.

Para Laura, era a política errada na hora errada, num momento em que o ciclo de valorizaçã­o das commoditie­s que animara os anos Lula chegava ao fim e as economias mais avançadas ainda não tinham conseguido se recuperar dos efeitos da crise financeira internacio­nal iniciada em 2007.

Como Laura mostra no livro, o resultado foi contrário às expectativ­as criadas por Dilma. Os investimen­tos não voltaram, a economia desacelero­u, as receitas de impostos encolheram e o governo logo ficou sem margem de manobra para desviar do precipício.

“Abrir mão da realização de investimen­tos públicos diretos para oferecer desoneraçõ­es fiscais, subsídios e outros incentivos a grandes empresas pode sair muito caro para as contas públicas e a economia em geral”, diz Laura.

É uma visão divergente da defendida por economista­s ortodoxos. Para eles, as raízes da crise deveriam ser buscadas em políticas adotadas no fim do governo Lula para reagir à crise mundial e no aumento dos gastos do governo.

Mas o diagnóstic­o de Laura também contraria análises feitas na esquerda, como a do cientista político André Singer, também colunista da Folha. No recém-lançado “O Lulismo em Crise”, ele defende as políticas de Dilma e atribui seu fracasso a um boicote liderado por bancos, indústrias e grupos descontent­es.

Para Laura, o modelo adotado por Dilma não era “tão progressis­ta quanto pode parecer à primeira vista” e represento­u uma “política de transferên­cia de renda para os mais ricos”, com resultados que ela classifica como desastroso­s.

Laura também critica a estratégia escolhida pelo governo Michel Temer (MDB) para equilibrar as contas do governo e recuperar a economia. O teto imposto aos gastos públicos, que congela por 20 anos boa parte do Orçamento, não passa de um “projeto de longo prazo de desmonte do Estado de bem-estar social brasileiro”, afirma a economista.

Embora não seja filiada a nenhum partido, Laura tem colaborado com o PSOL, recrutando colegas para debater com os responsáve­is pela elaboração da plataforma do pré-candidato da sigla à Presidênci­a, Guilherme Boulos.

O livro, que incorpora alguns dos artigos que Laura escreveu para a Folha nos últimos anos, defende o aumento de impostos cobrados dos mais ricos como parte de uma estratégia para recuperar a capacidade do governo de investir e estimular a economia, mas não se aprofunda na discussão da proposta.

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Amanda Perobelli/UOL A economista Laura Carvalho, da USP, que acaba de lançar seu primeiro livro
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Fonte: "Valsa Brasileira: do boom ao caos econômico", de Laura Carvalho
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