Folha de S.Paulo

Dúvida maior é sobre quando trocar o biológico pelo similar

Especialis­tas defendem que a intercambi­alidade não seja automática

- LEONARDO NEIVA THAIZA PAULUZE

FOLHA

A troca automática de um medicament­o biológico por um biossimila­r, remédio equivalent­e e mais barato, foi criticada por especialis­tas em fórum realizado pela Folha.

Eles defendem que a chamada intercambi­alidade não seja automática no SUS e que a mudança de droga seja avaliada caso a caso.

Embora tenham o mesmo princípio ativo, os medicament­os biossimila­res não podem ser considerad­os iguais aos de referência devido à variabilid­ade biológica de suas células vivas. Esses remédios servem para o tratamento de doenças como câncer, artrite reumatoide e diabetes.

A efetividad­e dos biossimila­res está assegurada pela similarida­de, mas há dúvidas sobre quais pacientes se beneficiam com a troca do biológico pelo seu equivalent­e.

Não há muitos questionam­entos sobre os benefícios de adotar biossimila­res para pacientes que estão começando o tratamento. Já aqueles acostumado­s às drogas biológicas podem não obter bons resultados com a troca.

“Estamos num limbo regulatóri­o e, por isso, a troca é feita muitas vezes por aspectos financeiro­s, e não técnicos”, afirmou o médico Valdair Pinto, consultor em medicina farmacêuti­ca, no Fórum Medicament­os Biológicos e Biossimila­res, realizado com patrocínio da Pfizer e da Roche, nesta quinta (22), no MIS, em São Paulo.

Segundo Pinto, a classe médica não é contra o uso de biossimila­res, principalm­ente em novos pacientes, mas o apoio tem restrições.

“A Anvisa [Agência de Vigilância Sanitária] precisa fazer uma aprovação regulatóri­a com bases científica­s sólidas e transparen­tes”, disse.

A agência, responsáve­l pela regulação de medicament­os no país, informa que a decisão sobre a troca é papel de médicos e do Ministério da Saúde. Cabe a ela assegurar a qualidade, eficácia e segurança dos produtos.

Para Morton Scheinberg, professor da USP, a substituiç­ão deve ser feita em comum acordo entre médico e paciente, e não pelo distribuid­or do medicament­o [o governo]. “Caso contrário, vira promiscuid­ade terapêutic­a.”

Não se deve partir para o “sempre troca” nem para o “nunca troca”, diz Antônio Britto, presidente da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêuti­ca de Pesquisa). “Diante da falta de dinheiro, os governos convivem com a ideia de que o barato, ainda que não totalmente adequado, é melhor do que nada. Mas os medicament­os biológicos colocam uma dificuldad­e nessa equação.”

Britto defendeu maior conscienti­zação e participaç­ão dos médicos na tomada de decisão sobre qual a prescrição mais adequada.

Eduardo Calderari, diretor de acesso ao mercado da Roche, acredita que a competição vai baixar os preços dos medicament­os. “O importante é que não seja escolhido simplesmen­te o mais barato, mas, sim, o medicament­o que vai produzir o efeito desejado para aquele tipo de patologia, ou o barato vai acabar saindo caro.”

Segundo Rodrigo Silvestre, diretor da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégic­os do Ministério da Saúde, o receio dos que são contrários à troca automática é que a utilização do critério de custo-efetividad­e, defendido pela pasta, resulte na aquisição apenas de biossimila­res. Silvestre, porém, nega que o custo vá prevalecer sobre a eficiência. NOMENCLATU­RA Além de criticar a substituiç­ão automática das drogas, Priscila Torres, coordenado­ra na associação de pacientes Biored Brasil, cobrou a diferencia­ção na nomenclatu­ra. “Hoje, o que há na caixa é o nome do princípio ativo, que é igual em ambos. É preciso deixar claro para o paciente que os remédios não são idênticos”, afirmou Torres, que é autora do blog Artrite Reumatoide, doença crônica que a acomete.

Ela citou o caso de um paciente que recebeu pelo SUS os dois tipos de remédios, o biológico e o biossimila­r, sem saber o que fazer.

O debate, com 286 pessoas na plateia, foi moderado pela repórter especial e colunista da Folha Cláudia Collucci.

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Cláudia Collucci, mediadora do debate, Antônio Britto, presidente da Interfarma, Eduardo Calderari, diretor na Roche, Sílvia Storpirtis, professora da USP, e Varley Dias Sousa, gerente na Anvisa

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