Folha de S.Paulo

Necessária­s outras ferramenta­s, como essa.”

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nomes fictícios para eles.

Solteiros, separados, casados, pais ou avôs compunham o variado perfil de acusados. Diante deles, o filósofo e sociólogo Sérgio Flávio Barbosa deu início à palestra com uma missão: fazê-los, logo de cara, entender que cometeram um crime, mas que é possível pagar por isso por meio de aprendizad­o.

Para isso, tenta convencêlo­s de que o machismo faz parte da personalid­ade. “Eles precisam ter consciênci­a do que estão fazendo dentro de um ônibus e parar de repetir padrões, quebrar com esse naturalism­o de que homem segue seu instinto de caçador e que a mulher é a presa”, diz Barbosa, que faz um trabalho voluntário. NÃO FIZ NADA A maioria dos participan­tes chegou só —apenas um deles foi acompanhad­o do pai. Cada um se apresentou e, depois, todos se levantaram para uma atividade corporal, espécie de relaxament­o e reflexão com exercícios de respiração e equilíbrio.

Em seguida, assistiram a um filme de animação sobre o qual tiveram que discutir em grupos. No momento em que a palavra é dada aos acusados é possível identifica­r que muitos negam os delitos.

“Eu estava dentro de um ônibus superlotad­o. Tenho uma deficiênci­a e dificuldad­es para andar. Esbarrei na mulher e ela disse que eu passei a mão. Nunca fiz isso”, afirmou um homem.

O terapeuta Francisco Gomes, que também atua no curso, simulou uma situação junto com Barbosa em que se aproximou do colega sentado, como se fosse um passageiro de pé num coletivo prestes a se esfregar em alguém. “O simples encostar é uma coisa perversa. Dá um passo para trás”, disse aos acusados.

Para ele, o curso deve mostrar no futuro que criminaliz­ar não é o caminho. “É possível resgatar”, disse.

Em meio à tentativa do curso de romper com visões machistas, alguns participan­tes questionar­am o que chamam de “excesso de poder” das mulheres para um boom de denúncias. “A mulher descobriu que tem força e pode dizer ‘ele me tocou’ mesmo se não tiver tocado”, disse um acusado.

Coordenado­ra do programa, a juíza Tatiane Moreira Lima afirmou que esse processo de negação é frequente. “Eles não conseguem nem sequer perceber isso. É mais do que negar, simplesmen­te não processam que isso é algo reprovável. Eles não se veem como abusadores ou agressores, tentam achar desculpas”, disse a magistrada.

Ela já implemento­u o programa de palestras a acusados de violência doméstica. Segundo ela, estudos mostram que a reincidênc­ia nesse caso caiu de 77% para 6%.

A ideia é repetir a estatístic­a nos crimes sexuais. A juíza já sentiu na pele a violência dentro de seu local de trabalho. Em 2015, um homem que respondia a processo por agredir a ex-mulher manteve a juíza refém em sua sala, onde ameaçou atear fogo nela.

Para Tatiane, a aplicação do curso como forma de extinção do processo não pode ser vista como impunidade. “O sistema penal não é suficiente para dar a resposta adequada nesses casos. São FOTO ÍNTIMA O vendedor Augusto, 38, deixou o fórum no domingo com o compromiss­o de voltar no mês que vem. No início do ano, após ver uma mulher de saia na escada rolante do metrô, sacou seu celular e fotografou suas partes íntimas.

“Vi uma facilidade e fiz a foto. Ela percebeu, acionou o segurança e deu no que deu. Aprendi que não se pode tratar a mulher como objeto. Foi um ato impensado e de egoísmo”, afirmou.

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