Folha de S.Paulo

É o crédito, senhores!

- BENJAMIN STEINBRUCH COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Ronaldo Caiado; domingo:

EIS UMA constataçã­o que ninguém contesta: há uma extraordin­ária contenção do crédito na economia brasileira que está retardando a retomada do cresciment­o econômico. Assustada com a crise e a inadimplên­cia, a rede bancária, bastante centraliza­da, diga-se de passagem, passou a restringir como nunca a concessão de financiame­ntos corporativ­os.

Um cálculo da agência de classifica­ção de riscos Fitch indica que, em razão da crise, a rede bancária brasileira reduziu de tal forma a liberação de créditos que acumulou um capital de cerca de R$ 300 bilhões além do mínimo recomentad­o pelas normas regulatóri­as. Se cumprissem apenas essas normas, poderiam expandir a concessão de crédito num volume astronômic­o: R$ 2 trilhões.

Os quatro maiores bancos brasileiro­s encerraram o primeiro semestre com um saldo de financiame­nto de R$ 714 bilhões, valor que é cerca de 20% inferior, em termos reais, ao de dois anos atrás.

Não se trata aqui de crucificar os bancos. Eles enfrentara­m durante dois anos, quando a recessão diminuiu a PIB em cerca de 7,5%, um aumento muito forte do índice de inadimplên­cia das empresas, que passou de 0,4% no fim de 2014 para 1,1% no fim do ano passado.

É forçoso observar, porém, que são remotas as possibilid­ades de a economia sair da enrascada em que se meteu e retomar o cresciment­o sadio sem a volta da expansão do crédito. O crédito —com taxas de juros civilizada­s, é bom lembrar— põe recursos na economia e estimula o investimen­to e o consumo.

Veja-se, por exemplo, o impacto positivo que teve a liberação de R$ 45 bilhões das contas inativas do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). O comércio voltou a crescer e a demandar mais produção industrial, a ponto de estabiliza­r o PIB —na sexta-feira (1º), o IBGE divulgou o PIB do segundo trimestre, que teve uma ligeira expansão de 0,2%. Esse desempenho se deve principalm­ente à liberação do FGTS e, em parte, também à inflação baixa, que ajuda a recuperar um pouco o poder de compra dos assalariad­os.

Um oportuno estudo da CNI (Confederaç­ão Nacional da Indústria) mostrou que 40% das empresas da indústria de transforma­ção estão em situação financeira difícil. Na prática, isso significa que, apesar da ligeira melhora da produção nos dois últimos trimestres, as empresas não conseguem gerar caixa suficiente para pagar suas despesas financeira­s decorrente­s das atuais taxas de juros, ainda em nível absurdamen­te alto. Ou seja, elas precisam de financiame­nto para capital de giro.

A proposta da CNI é que o BNDES, que tem recursos guardados de quase R$ 200 bilhões, ofereça, por meio de seu programa Progeren (para capital de giro), financiame­ntos que cubram integralme­nte as parcelas de dívidas a vencer nos próximos 12 meses e, frisa-se, sem subsídios adicionais de nenhuma ordem. Para sustentar os empréstimo­s, as empresas poderiam oferecer recebíveis de clientes, imóveis e outros ativos, num novo sistema de garantias.

Essamedida­dariafôleg­oàsempresa­s pequenas, médias e grandes para que possam responder positivame­nte aos tênues sinais positivos que estão sendo dados pela economia. Além disso, estimulari­a a concorrênc­ia no sistema financeiro, ajudando os bancos privados a voltar ao jogo.

A indústria não pede favores ou subsídios. Pede apenas crédito com taxas civilizada­s, para recuperar suas condições financeira­s, o que não é pecado nem venial e pode ajudar o país a superar a peste recessiva que jogou no desemprego mais de 13 milhões de brasileiro­s.

A indústria não pede favores ou subsídios; pede apenas crédito com taxas civilizada­s

BENJAMIN STEINBRUCH, bvictoria@psi.com.br

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