Folha de S.Paulo

Fora da Presidênci­a, Correa mira ex-aliado que o sucedeu

Ex-presidente do Equador usa jornal e rede social para criticar Lenín Moreno após governo acelerar investigaç­ão de corrupção

- SYLVIA COLOMBO

Nem bem completou um mês no cargo, Lenín Moreno, o atual presidente do Equador, já se vê na posição de ter de se defender de um inusitado opositor: seu padrinho político, Rafael Correa.

Mesmo tendo viajado no começo desta semana para a Bélgica, onde anunciara que passaria um tempo com a família (a mulher de Correa é belga), o ex-presidente vem fazendo sua voz ser ouvida por meio de redes sociais e da coluna que mantém no jornal governista “El Telégrafo”.

Correa começou em tom ameno logo após a posse, com advertênci­as a Moreno sobre o excesso de atenção que estava dando a jornalista­s e tentando desestimul­ar que seu afilhado acelerasse as investigaç­ões de casos de corrupção revelados pelas delações da Operação Lava Jato.

Segundo o Departamen­to de Justiça dos EUA, a construtor­a brasileira Odebrecht pagou no Equador US$ 33 milhões (R$ 105 milhões) em caixa dois e subornos para benefícios em licitações.

Porém, para Correa, a “verdadeira corrupção” é outra, “é a das forças que sempre repartiram o Estado equatorian­o entre elas e contra as quais lutei nos últimos dez anos”, como reafirmou num de seus recentes artigos.

Moreno, a princípio, disse que as observaçõe­s do padrinho seriam sempre bem-vindas. “O diálogo continua. Seguimos empenhados em reconcilia­r o país. Para o ódio, não contem comigo”, disse.

As coisas começaram a azedar nas últimas duas semanas, quando Correa acusou Moreno de estar “cometendo graves erros” e “cruzando uma linha vermelha”, ao buscar diálogo com opositores. “Em sua tentativa de diferencia­r-se de mim, está sendo não só desleal como também medíocre”, afirmou.

Pontualmen­te, o que mais irritou Correa foi o fato de Moreno ter se reunido com Dalo Bucaram, filho do ex-presidente Abdalá Bucaram (199697), para criar uma comissão anticorrup­ção que incluiria diferentes forças políticas e teria apoio da ONU.

Correa lembrou a Moreno que seus ministros dessem entrevista­s, alertou Moreno para o acesso que vinha dando a jornais antes considerad­os inimigos.

Correa também não gostou que o sucessor acabasse com as “sabatinas”, programas de sábado em que o então presidente prestava contas à população, a seu modo, do que havia feito o governo.

“Um governante precisa prestar contas à cidadania, não aos meios privados. Na minha gestão corrigimos esse erro, que agora volta a ser cometido”, disse Correa.

Moreno então perdeu a paciência e disse que seu padrinho político mostrava, por meio da “verborragi­a nas redes sociais”, estar com “abstinênci­a de poder”. Correa tem 3 milhões de seguidores no Twitter, os quais chama de “guerreiros digitais”.

Desde que deixou o cargo, o ex-presidente vem repetindo também que não é sua intenção concorrer em 2021, mas ressalva: se continuar assistindo à “destruição de meu legado, irei repensar”.

No dia da partida de Correa para a Europa, Moreno enviou apenas uma mensagem ao antigo padrinho: “Rafael, faça uma boa viagem. Em nome dos equatorian­os, agradeço tudo o que fez por nós, sobretudo pelos mais pobres e mais vulnerávei­s”.

Na despedida no aeroporto, Correa foi saudado por milhares que repetiam “Rafael, sempre presidente”.

 ?? Ariana Cubillos - 13.jul.2017/Associated Press ?? Opositores a Nicolás Maduro fazem vigília em Caracas pelos mortos nas manifestaç­ões
Ariana Cubillos - 13.jul.2017/Associated Press Opositores a Nicolás Maduro fazem vigília em Caracas pelos mortos nas manifestaç­ões
 ?? Santiago Armas - 10.jul.2017/Xinhua ?? O ex-presidente do Equador, Rafael Correa, saúda apoiadores no aeroporto de Quito antes de embarcar para a Bélgica
Santiago Armas - 10.jul.2017/Xinhua O ex-presidente do Equador, Rafael Correa, saúda apoiadores no aeroporto de Quito antes de embarcar para a Bélgica

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