Folha de S.Paulo

A linguagem do tempo

- JANIO DE FREITAS

NO SEU primeiro dia de condenado, Lula completou 37 anos de uma data especial. Estava preso então pela ditadura, sob acusações que na forma se distinguem das atuais, mas vêm ambas do mesmo substrato. Naquele dia, Lula teve licença, sob escolta policial, para se despedir da mãe, na missa de corpo presente que antecedeu o enterro.

No dia mesmo em que Sergio Moro formalizav­a a condenação de Lula a nove anos e meio cadeia, o Senado eliminava direitos vigentes, alguns deles, há 67 anos, como partes essenciais da Consolidaç­ão das Leis do Trabalho.

Não fosse a existência dessa CLT, com a proteção e os direitos de luta por melhores condições para os trabalhado­res, Lula não chegaria à Presidênci­a para fazer, entre erros e acertos políticos, a única política de redução das desigualda­des sociais no Brasil republican­o. Enquanto Sergio Moro informava E dispensado até da tornozelei­ra que dificultar­ia suas possíveis movimentaç­ões para “ir às compras”, como dele e de seu crescente patrimônio dizia Antonio Carlos Magalhães.

O tempo cuidou de tecer alguns fatos para exprimir, por equivalênc­ias e contrastes, o sentido da condenação, que as duas centenas de páginas da sentença buscaram encobrir. Se com êxito ou não, é cedo para perceber mudança de opiniões.

“The Guardian”, o mais importante jornal inglês, pela honestidad­e jornalísti­ca, contrapôs à notícia da condenação o realce da “admiração global pelas políticas sociais transforma­doras” da Presidênci­a de Lula.

Não é a essa admiração, porém, que a sentença se refere quando, incoerente, recusa-se a decretar interpreta­ções da frase pensaram em reação popular. Mas não há por que não supor Moro contido pelo temor do seu próprio trauma: mais do que ninguém, ele sabe o que está fazendo.

E dizendo. Foi adequado que citasse em inglês a frase cuja variante em português é o caricato “ninguém está acima da lei”. A citação aparece na sentença de processo que Moro açambarcou: a lei o destina à área judicial onde fica o apartament­o em questão —Guarujá, não Curitiba. Moro alegou a conexão, nunca demonstrad­a, do apartament­o com os subornos na Petrobras. e pelo STF, com o auxílio não menos indigestiv­o de Gilmar Mendes.

A Lava Jato deveria ser objeto de estudo pelo que faça de positivo. Será estudada por muito mais tempo do que quaisquer condenaçõe­s de Lula, mas por arbitrarie­dades e desmandos puníveis nos demais procurador­es e juízes.

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