Folha de S.Paulo

GOVERNO ENCURRALAD­O Funaro intimidava desafeto com rasantes de helicópter­o

Preso na Operação Lava Jato, corretor de valores negocia delação premiada

- WÁLTER NUNES

Em cidade natal da sua mãe, ‘Funarinho’ fez ameaças a inimigos, mas também ganhou fama de filantropo

“Funarinho saiu na ‘Veja’.” Esse era o assunto na tarde de sábado, em 2007, no bar do Paulo Martins, ponto de encontro de Vargem Grande do Sul, cidade paulista com cerca de 40 mil habitantes.

Tratado pelo sobrenome no diminutivo pelos amigos do interior, Lúcio Bolonha Funaro hoje está preso pela Operação Lava Jato e negocia acordo de delação premiada que tem causado insônia em parlamenta­res e integrante­s do governo, incluindo o presidente Michel Temer.

Em 2007 a Lava Jato ainda não estava no horizonte, mas Funaro já protagoniz­ava escândalos. No botequim lotado, os clientes comentavam sobre uma reportagem que dizia que o corretor de valores havia declarado ao Ministério Público que José Dirceu ou o PT havia recebido R$ 500 mil de propina pela indicação de diretores para o fundo de pensão dos funcionári­os das Companhias Docas.

Entre os frequentad­ores do lugar havia um infiltrado que tratou de alertar Funaro. Não demorou para o corretor entrar bufando de raiva no bar. Perguntou quem estava ali falando besteiras sobre ele. Chutou uma cadeira e empurrou o advogado José Pedro Cavalheiro, que iniciara a conversa sobre a reportagem.

Ao ver Funaro intimidand­o os clientes, o dono do bar atravessou o balcão e, de porrete em punho, expulsou Funaro do lugar. “Quem ele pensa que é para arrumar confusão em meu bar?”, disse à Folha Paulo Martins. “Toquei ele para fora.”

Dois dias depois da rixa, veio o troco. Funaro foi até o proprietár­io do prédio onde estava instalado o bar e comprou o imóvel por R$ 300 mil. Despejou Martins do local e colocou o antigo botequim abaixo. Espalhou na cidade que Martins não honrava suas contas, o que fez com que o dono do bar o processass­e por calúnia e difamação.

Funaro é de São Paulo, mas frequentav­a Vargem Grande do Sul, cidade natal de sua mãe, desde a infância. Na adolescênc­ia vendia dólares aos moradores que queriam viajar ao exterior. Saiu para estudar administra­ção e voltou milionário.

Aparecia na cidade pilotando um Lamborghin­i preto e se divertia com a trapalhada que provocava nos frentistas, que não sabiam onde ficava o tanque do automóvel para abastecê-lo.

Frequentav­a a missa aos domingos e ganhou fama de filantropo ao arrematar bezerros em leilões beneficent­es e doá-los à igreja. Ergueu no alto da cidade uma mansão com heliponto.

A partir do mensalão, onde apareceu como operador das propinas do PL (atual PR), passou a frequentar o noticiário nacional.

Pouco tinha como intimidar a imprensa da capital, mas em Vargem Grande do Sul ele passou a ameaçar jornalista­s. A “Gazeta de Vargem Grande” despertou a sua ira ao noticiar a prisão na Operação Satiagraha. A cada reportagem sobre os desdobrame­ntos da investigaç­ão ele se voltava contra Tadeu Ligabue, dono da publicação.

Voava com seu helicópter­o dando rasantes rente ao teto do jornal e da casa do jornalista. Dirigia impropério­s sempre que o encontrava. Ligabue não quis falar sobre Funaro. Delatores da Lava Jato parecem dar razão à cautela.

O empresário Milton Schahin disse ter ouvido de Funaro: “Você está com câncer, né? Pois vou comer seu fígado com câncer e tudo”. O exvice-presidente da Caixa Econômica Federal Fábio Cleto disse que o doleiro ameaçou colocar fogo em sua casa, com os filhos dentro.

O advogado José Pedro Cavalheiro, alvo da ira de Funaro no bar de Paulo Martins, nega que tenha “conhecimen­to sobre a briga”. Ele não falou com a reportagem.

Apenas Paulo Martins mantém a valentia. Seu bar continua na rua do Comércio, mas na esquina oposta ao antigo endereço. “Ele já tentou fazer acordo comigo por causa do processo, mas eu não quero papo com esse cara. A mim ele não mete medo.”

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Pedro Ladeira - 23.jun.2017/Folhapress Lúcio Funaro chega a prédio da Justiça Federal em Brasília

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