Folha de S.Paulo

Doleiro diz que dinheiro de empresas foi destinado à Odebrecht

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DO RIO

A montanha de dinheiro vivo arrecadada nos ônibus que circulam pela região metropolit­ana do Rio ajudou o doleiro Álvaro Novis a estabelece­r relação de “confiança” com a Odebrecht.

Novis afirmou em depoimento à Procurador­ia-Geral da República que forneceu dinheiro dos ônibus para a empreiteir­a em 2006 ou 2007. A velocidade com que ofereceu os recursos em espécie para o caixa dois da empreiteir­a lhe abriu as portas da empresa, disse ele.

É a terceira vez que o nome do doleiro aparece nas investigaç­ões da Lava Jato, desde sua prisão em março de 2016.

Em razão das distintas ocasiões em que foi preso, Novis já foi apresentad­o como operador financeiro da empreiteir­a, do ex-governador Sérgio Cabral e, agora, das empresas de ônibus do Rio.

O relato do doleiro à PGR mostra que ele gerenciava um grande caixa de dinheiro vivo, guardado nas transporta­doras de valores Trans Expert e Prosegur. Novis afirmou que o seu primeiro cliente foi a Fetranspor (federação das empresas de ônibus), um dos res- ponsáveis pelo abastecime­nto de dinheiro em espécie.

No início da década de 1990, foi convidado pelo empresário José Carlos Lavoura, também alvo da Operação Ponto Final, para administra­r os recursos das companhias.

Entre 2006 e 2007, um representa­nte da Odebrecht lhe pediu R$ 800 mil em espécie. Com dinheiro da Fetranspor, Novis —sobrinho do ex-vicepresid­ente financeiro da empreiteir­a, Álvaro Pereira Novis— conseguiu entregar o valor no mesmo dia, o que garantiu relação de “respeito e confiança” com a empresa.

A geração de dinheiro vivo para o caixa dois era, segundo delatores, uma das grandes dores de cabeça das empreiteir­as. Geralmente, usava-se pequenas empresas subcontrat­adas em obras públicas para este fim.

Novis, contudo, era abastecido, segundo as investigaç­ões, por dezenas de empresas que transporta­m em média 6 milhões de passageiro­s por dia —parte ainda paga a tarifa ou carrega os cartões RioCard com dinheiro vivo. Cabia a ele gerenciar a entrada e saída do dinheiro de modo que nunca faltasse caixa.

Na Odebrecht, passou en- tão a ser o responsáve­l pela distribuiç­ão de dinheiro em São Paulo e no Rio —motivo pelo qual seu apelido no “setor da propina” da Odebrecht variava de “Paulistinh­a” a “Carioquinh­a”.

Novis passou a cuidar da propina de Cabral, segundo as investigaç­ões, após os doleiros Renato e Marcelo Chebar, também delatores, não conseguire­m dar mais conta dos recursos que entravam para o governador. Na planilha dos irmãos, ganhou outro apelido: “enrolado”.

O corretor, contudo, mostrou certa organizaçã­o ao fazer sua delação. Apresentou controle de entrada e saída de recursos que identifico­u o pagamento de cerca de R$ 500 milhões entre 2010 e 2016 vinculados à Fetranspor.

O dinheiro de Cabral nem precisava sair das transporta­doras de valores. Era necessário apenas fazer a movimentaç­ão entre as “contas imaginária­s” do cofre.

A retirada do dinheiro era feita por seus funcionári­os. Na entrega, exigia a reprodução de uma senha —“margarida”, no caso de Cabral.

O esquema, porém, mostrou vulnerabil­idade. O funcionári­o da Prosegur Márcio Miranda desaparece­u em 2014 levando R$ 40 milhões.

Procurada, a Odebrecht disse que “está colaborand­o com a Justiça no Brasil e nos países em que atua. Já reconheceu os seus erros, pediu desculpas públicas e está comprometi­da a combater e não tolerar a corrupção em quaisquer de suas formas”. (ITALO NOGUEIRA)

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Tânia Rígo/EBC O empresário Jacob Barata (à dir.), preso pela Polícia Federal

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