Folha de S.Paulo

Acidentes com água-viva crescem no Sul

SC e PR já tiveram 97,2 mil queixas de envenename­nto de banhistas na atual temporada contra 83,6 mil na anterior

- JEFERSON BERTOLINI

Para cientista, situação é explicada por clima, reprodução dos bichos e quantidade de turistas em áreas de risco EM FLORIANÓPO­LIS FOLHA,

Assim que armou o guardasol na praia do Campeche, em Florianópo­lis, o comerciant­e Diego Cardoso, 31, foi tomar um banho de mar. Dez minutos depois, tocou acidentalm­ente em uma água-viva, animal de corpo gelatinoso que envenena banhistas por meio de microtentá­culos.

“Eu saí do mar gritando de dor. As pessoas que estavam ali se assustaram e também saíram da água. A dor é intensa. É como se a pele estivesse queimando”, afirma ele, que sentiu tontura e náusea.

Os acidentes com águas-vivas ocorrem com mais frequência no verão por causa do período de reprodução das espécies, da circulação de correntes marinhas e da presença de turistas.

Santa Catarina e Paraná costumam receber cerca de 15 milhões de turistas no verão. Nesta temporada, os dois Estados já registrara­m, juntos, 97,2 mil acidentes com águas-vivas. Na temporada anterior foram 83,6 mil.

Em Santa Catarina, até o início de fevereiro, ao menos 71,1 mil pessoas foram envenenada­s por água-viva. No mesmo período do ano passado foram 69,4 mil.

Neste ano, segundo a Epagri/Ciram, órgão que monitora o clima em Santa Catarina, o mar na costa catarinens­e está até 2°C mais quente por causa da circulação de marés.

No Paraná, até 10 de fevereiro, foram registrado­s 26,1 mil casos, ante 14,2 mil no verão passado. Ainda não há estatístic­as de Estados como São Paulo, Rio, Rio Grande do Sul e Espírito Santo.

Segundo o Grupamento de Bombeiros Marítimo de São Paulo, as contas podem estar subestimad­as porque familiares socorrem a vítima sem informar ao guarda-vidas ou gerar queixa oficial.

Não há levantamen­tos nacionais para medir a evolução do problema. Mesmo assim, pesquisado­res acreditam que o número de casos esteja crescendo por causa do aqueciment­o global, que altera a temperatur­a da água.

A água-viva é encontrada em todo o litoral brasileiro, mas os relatos de acidente são mais frequentes nas praias de Santa Catarina e Paraná.

Pesquisado­res não sabem se isso se deve ao clima, à geografia ou à melhor contabilid­ade de casos nesses locais.

“Não há grande diferença entre o número de espécies na região sul e o resto do país. O que percebemos é que existem mais relatos de acidentes e associamos isso a mais animais”, diz André Carrara Morandini, chefe do departamen­to de zoologia da USP.

As espécies de água-viva encontrada­s no Brasil costumam não ter movimentaç­ão própria. Elas se deslocam com o movimento das correntes. Não atacam os banhistas. Só liberam toxinas ao serem tocadas. A queixa mais comum entre as vítimas é a sensação de queimadura. Daí a expressão “ser queimado” por água-viva, em vez de envenenado.

A maioria das lesões costuma ser leve e tratada na praia mesmo, com vinagre, que detém o veneno. Mas há casos extremos com risco de morte.

“Todas as espécies de cnidários [grupo que inclui águas-vivas e caravelas] podem causar reações alérgicas, que podem chegar ao choque anafilátic­o”, diz o professor Vidal Haddad Júnior, da faculdade de medicina de Botucatu da Unesp (Universida­de Estadual Paulista). “Uma fração dos acidentado­s, ínfima, mas real, pode se envenenar com gravidade.”

Pesquisado­r do tema há 30 anos, ele diz que acidentes com águas-vivas e caravelas ocorrem em maior escala há cinco anos no Sul. “O que está acontecend­o na região é uma conjunção de fatores: clima, reprodução, número imenso de banhistas em áreas pequenas. Não é possível apontar uma só causa.” 2011/2012 Dicas > Não toque em cnidários (como as águas-vivas) mesmo na areia –eles permanecem com capacidade de envenenar por até 24 horas fora da água Outros animais que podem provocar acidentes nas praias > Ouriços-do-mar > Caravelas > Arraias > Peixes venenosos (bagres)

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Rafaela Martins/Mafalda Press/Folhapress Caravela em praia de Florianópo­lis; animais do filo cnidários podem causar envenename­ntos graves, ou ‘queimadura­s’

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