Folha de S.Paulo

Além da Lava Jato

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No ambiente degradado da política brasileira, a corrupção se estende muito além da esfera investigad­a pela Lava Jato.

Inúmeras outras práticas ilícitas, todavia, acabam ofuscadas pela intricada teia de desvios bilionário­s apurada pela força-tarefa mais famosa do país —o que não significa, pelo menos em termos éticos, que sejam menos nocivas.

No Estado de São Paulo, por exemplo, registrara­m-se neste mês sucessivos pedidos de prisão de políticos no nível dos municípios.

A Justiça decretou, no dia 6, a prisão preventiva de nada menos que 14 dos 21 vereadores de Osasco. Entre eles está o prefeito eleito Rogério Lins (PTN), cuja campanha veiculou a promessa de “tolerância zero com a corrupção”.

Investiga-se um esquema de funcionári­os fantasmas —daí a operação ser batizada de Caça-Fantasmas— na Câmara de Vereadores. Segundo o Ministério Público, o prejuízo gerado monta a pelo menos R$ 21 milhões, para o que contribuír­am mais de 200 pessoas.

Em viagem internacio­nal desde o começo do mês, Lins é considerad­o foragido da Justiça.

Na mesma situação encontra-se o prefeito eleito de Embu das Artes, Ney Santos (PRB), cuja prisão preventiva foi decretada no dia 9. Ele é suspeito de lavar dinheiro para a facção criminosa PCC. Desde então não se sabe de seu paradeiro.

Santos e seu vice, Peter Calderoni (PMDB), tiveram a posse suspensa em caráter provisório pela Justiça Eleitoral. Suspeita-se que o tráfico de drogas tenha financiado a campanha de ambos.

No dia seguinte à operação em Embu das Artes, Luccas Inague Rodrigues (PP) e Reginaldo Luiz Ernesto Cardilo (PP), futuros prefeito e vice de Presidente Bernardes, foram presos sob a acusação de que teriam coagido testemunha­s de um inquérito sobre crimes eleitorais.

Para além da instabilid­ade que produziram nesses municípios, tais casos demonstram quão difusa e diversa é a relação entre agentes públicos e crimes no Brasil.

Embora pareça inevitável, diante de tantos exemplos, lamentar os destinos da política, é possível enxergar algo de positivo. Tratase, sem dúvida, de um “processo evolutivo”, como destacou a Associação Paulista de Municípios.

Foi-se o tempo em que permanecia­m clandestin­os ou impunes os mais variados delitos praticados por políticos. Cada vez mais órgãos de investigaç­ão percebem que o combate aos desvios não pode se circunscre­ver à Lava Jato —pois os criminosos decerto não limitaram sua atuação ao que a força-tarefa consegue descobrir.

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