Folha de S.Paulo

Chefe da Unasul diz que Vaticano se unirá a negociaçõe­s por diálogo político em Caracas

- SAMY ADGHIRNI

O secretário-geral da Unasul (União de Nações SulAmerica­nas), Ernesto Samper, disse nesta quinta que a Igreja Católica se juntará ao esforços internacio­nais em busca de um diálogo entre governo e oposição para apaziguar tensões na Venezuela.

O anúncio ocorreu durante visita a Caracas na qual Samper e outros representa­ntes da Unasul também trataram de um pacote de medidas econômicas sugerido ao presidente Nicolás Maduro para frear a grave crise econômica no país.

“A aceitação da participaç­ão do Vaticano irá nos enriquecer espiritual­mente e politicame­nte”, disse Samper, acompanhad­o dos três ex-dirigentes que atuam na Venezuela em nome da Unasul: o ex-premiê espanhol José Luis Rodríguez Zapatero, o ex-presidente dominicano Leonel Fernández e o ex-presidente panamenho Martín Torrijos.

A medida atende uma das principais condições da aliança de partidos opositores MUD (Mesa da Unidade Democrátic­a) para dialogar com Maduro.

Em 2014, quando protestos antigovern­o resultaram em 43 mortos, a igreja havia tentado mediar um diálogo, mas caiu em desgraça com o chavismo por apoiar a oposição.

A MUD também condiciona o diálogo à libertação de opositores e ao respeito ao funcioname­nto do Legislativ­o, dominado pela oposição, mas neutraliza­do pelo Executivo. Já Maduro exige apoio ao seu programa de “emergência econômica”, que aumenta controles do Estado sobre o setor privado. PROPOSTA A Unasul propõe uma espécie de meio termo entre o modelo socialista e o opositor para reverter a espiral de desabastec­imento e inflação que assola os venezuelan­os.

Mas o pacote, apresentad­o a Maduro em junho e cujos detalhes não são públicos, encontra resistênci­a chavista, segundo a Folha apurou.

Uma das propostas é substituir o complexo modelo de câmbio, que possui duas taxas oficiais às quais se soma uma cotação paralela muito usada, por um sistema unificado e flutuante.

Segundo economista­s da Unasul, entre os quais o brasileiro Pedro Barros, emprestado pelo Ipea, e o venezuelan­o Francisco Rodríguez, exguru

ERNESTO SAMPER

secretário-geral da Unasul do tema Venezuela no Bank of America, a cotação dupla gera distorções que favorecem especulado­res e pioram o desabastec­imento.

A proposta tem apoio da vice-presidênci­a econômica, mas o Ministério do Comércio Exterior é contra.

Outro aspecto polêmico é a proposta de trocar subsídios indiretos (embutidos no preço de gasolina, luz e alimentos) por subsídios diretos em dinheiro.

O sistema funcionari­a com um cartão de débito entregue a cada família, semelhante ao Bolsa Família brasileiro.

O cartão já foi entregue de forma experiment­al a 300 mil famílias. O sistema garante a cada uma 14 mil bolívares (US$ 14 na cotação paralela usada por particular­es) mensais disponívei­s no cartão.

A Unasul busca estendê-lo a mais 2 milhões de famílias, mas isso exigiria a criação de um cadastro integrado de beneficiár­ios, ao qual se opõem setores chavistas envolvidos num recém-criado sistema de distribuiç­ão de alimentos.

Algumas propostas da Unasul já são implementa­das. Sem alarde, o Banco Central da Venezuela enviou dados econômicos atualizado­s ao FMI (Fundo Monetário Internacio­nal), algo que não acontecia havia 12 anos.

Outro tema é a renegociaç­ão das bilionária­s dívidas de Caracas junto ao clube de Paris, grupo informal de credores em 21 países. As negociaçõe­s estão a cargo do ex-presidente Fernández, com bom trânsito nos EUA.

A aceitação da participaç­ão do Vaticano [nas negociaçõe­s por diálogo entre governo e oposição na Venezuela] irá nos enriquecer espiritual­mente e politicame­nte

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