Ninguém está protegido
É impossível escapar do choque causado pela morte brutal de três pessoas durante o tiroteio ocorrido em plena tarde da última terça-feira na praia de Jaguaribe, uma das mais movimentadas da cidade e conhecido reduto dos surfistas. O episódio representa o auge da escalada de violência que, gradativamente, vem pintando Salvador de sangue desde o início da pandemia. Ao mesmo tempo, mostra que nenhum cidadão da capital pode se achar livre dos reflexos mortais provocados pelo avanço da criminalidade sem freio e, agora, sem qualquer pudor.
Para entender a dimensão da cena de terror testemunhada por dezenas de pessoas é preciso, primeiro, pensar nas vítimas. Duas delas - um estudante de 16 anos morador do luxuoso condomínio Le Parc e uma aluna de Biomedicina da Bahiana - não tinham a menor ligação com o alvo dos bandidos ou histórico de envolvimento com o crime.
Ambos estavam na praia para aproveitar um dos poucos momentos de liberdade e lazer em um período marcado pelo distanciamento do cotidiano comum a todo jovem ou adolescente. Igor Lima Filho tinha ido a Jaguaribe praticar futevôlei com os amigos, uma de suas paixões. Juliana Alcântara, 20 anos, havia deixado o Imbuí, bairro onde morava, para curtir o dia de sol e mar com a mãe, atingida de raspão no faroeste litorâneo.
De pronto, a tarde sangrenta prova que a bandidagem letal da cidade já não escolhe hora e lugar para agir. de classe média alta, sicários cheguem atirando a esmo e assassinando pessoas inocentes, somente pelo desejo de resolver assuntos da esfera exclusiva do crime.
A única explicação minimamente razoável para a falta de temor demonstrada na ação que deixou três mortos e mais três feridos tem origem na evidente falha do policiamento ostensivo. De que outra forma bandidos se sentiriam tão à vontade para promover ataque em massa em uma região da cidade com grande fluxo de turistas, praticantes de esportes radicais e à beira-mar, banhistas de diversos bairros e ampla visibilidade? Especialmente, se for levado e conta que estamos no Verão, quando o movimento na orla cresce substancialmente.
Do mesmo modo, pode-se atribuir a cena de bangue-bangue ao descontrole na segurança pública da cidade em 2020. Os números não mentem. A partir de março, quando a OMS declarou estado de pandemia, houve crescimento nos índices de homicídios intencionais em praticamente todos os meses, com destaque para novembro (70%) e abril (41%). Antes, em fevereiro e janeiro passados, a curva vinha em rota ascendente.
Ainda assim, regiões da cidade, mesmo aquelas mais visadas, permanecem sem policiamento efetivamente presente para garantir a integridade e a vida das pessoas. No geral, as forças policiais aparecem quando a morte já varreu o pedaço. Mas é necessário que elas estejas antes da bala.