‘O poeta não envelh
Aos 75 anos, Paulinho Boca de Cantor lança disco e diz que o isolamento imposto pela Covid-19 tem sido um período ‘muito fértil’ artisticamente
Paulinho Boca de Cantor, 75, tem muitas histórias para contar. E ele tem aproveitado o isolamento da Covid para gravar em áudio algumas delas, que divide entre “pérolas soltas” e “pérolas loucas”. “E eu gosto de falar pra caramba!”, brinca o cantor e compositor, que é um dos fundadores dos Novos Baianos.
“As soltas são as mais brandas. As loucas são uma loucura total!”, diz, entre risos, em entrevista à coluna de Mônica Bergamo, da Folha. Ele ainda não sabe o que irá fazer com as gravações, mas diz que “já tem gente de olho” e, quem sabe, poderá ser um novo projeto no futuro.
Entre as histórias, conta quando ganhou o apelido, aos 17 anos. “Eu era crooner de uma orquestra e um amigo me viu descansando embaixo de uma mangueira depois de um ensaio”, diz. “E tinha um cachorro do meu lado que abriu o bocão. Aí, meu amigo disse: ‘Ô, King, boca de pantera! Você tá aí do lado do Paulinho boca de cantor’. A gente começou a dar risada e o apelido pegou.”
Nascido em Santa Inês, cidade no interior da Bahia com pouco mais
Ude 10 mil habitantes, Paulo Roberto Figueiredo de Oliveira diz que canta desde criança. E conta que o confinamento imposto pela epidemia foi “muito fértil” artisticamente.
“Tem um ditado aqui na Bahia que diz que ‘quando a gente está parado, está carregando pedra’. Então, não parei de trabalhar.”
O cantor acaba de lançar o disco solo “Além da Boca”, divulgado nas plataformas digitais no último dia 20, e diz que compôs músicas suficientes para montar um próximo CD.
No novo álbum, ele assina as 11 faixas e conta com participações de velhos parceiros, como Luiz Galvão, e de nomes como Zeca Baleiro, Tim Bernardes, Anelis Assumpção, Manoel Cordeiro e Curumin. “Todas essas participações me renovaram muito. É um frescor que essa juventude traz para o trabalho. Isso reinventa a gente”, diz ele, que classifica o disco como uma “grande festa”.
Paulinho afirma que se interessa muito pela cena musical atual do país e avalia que há uma “fertilidade incrível”. Por outro lado, diz que o Brasil não valoriza seus artistas. “Aqui, não dá pra viver de direitos autorais. Hoje, disco digital é um terror. Você vê que sua música tocou no Azerbaijão e chega [para você] R$ 0,0001. É um absurdo!” O cantor conversou com a coluna por chamada de vídeo direto de seu apartamento em Salvador. Bem-humorado, Paulinho recitou poesias e soltou a voz com trechos de algumas canções ao longo da conversa.
Ele afirma que não vê a hora de poder subir ao palco para se apresentar presencialmente no pós-epidemia. “Quero fazer um show maravilhoso e receber todo mundo no camarim depois para aquele abraço fraterno, sabe? E também reencontrar a família, ficar todo mundo pertinho”, continua. O artista tem três filhos, sendo um deles Betão Aguiar, que produziu o disco, e três netos. Ele é casado há 31 anos com Virgínia Amaral, sua segunda esposa.
Diz que já tomou as duas doses da vacina contra a Covid e critica quem é contra a vacinação. “Já vi gente dizer que é contra, mas na hora que a barra pesa, corre e vai lá se vacinar. Agora, quem é ideologicamente contra, aí sim, precisa mesmo se vacinar dessa loucura. A gente tem visto essa ideologia torta, esse retrocesso, em várias áreas do Brasil.”