Agora

A cana é bela!

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Alambique no interior do estado investe na pureza para produzir cachaça de alta qualidade

Acachaça é tão presente no cotidiano do brasileiro, que talvez nenhum outro substantiv­o tenha tantos sinônimos dentro da língua portuguesa. Você pode gastar todo o abecedário. Sempre vai haver uma opção desde A até Z para pedir uma água-quepassari­nho-não-bebe. Do Oiapoque ao Chuí são dezenas de nomes para apelidar aquela branquinha: assovio-de-cobra, bafode-tigre, café-branco, desmanchad­eira, engasga-gato, faz-xodó, goró, homeopatia, imaculada, já-começa, limpa-olho, mangaba, nó-cego, otim-fim-fim, pela-goela, querosene, retrós, sete-virtudes, três-martelos, uca, veneno, ximbica e zinabre.

Eu, que também sou filho de Deus, gosto de dar as minhas talagadas. Ao mesmo tempo em que me debruçava nos livros escolares, trabalhava com meu pai, o velho Chicão, em seu boteco. Lá, fui introduzid­o nas artes dos balcões de fórmica. Entre ovos coloridos, bolas pregadas na caçapa e goles da saudosa Brahma Porter, aprendi a distinguir a qualidade de uma aguardente industrial de uma boa marvada de alambique. Nada contra a velha pinga, mas antes de ter barba na cara, já conhecia de olhos fechados o aroma inconfundí­vel de uma Claudionor Carneiro.

Felizmente, muita coisa mudou desde minha adolescênc­ia. Esforços do setor cachaceiro nas últimas décadas colocaram a bebida em outro patamar. Outrora marginaliz­ada, a nossa aguardente passou a ser encarada como destilado de qualidade. Hoje, a cachaça é mais do que um en

gasga-gato e bate de frente com conhaques, uísques, runs, vodcas e outras biritas do mundo afora. Por isso, não pensei duas vezes ao aceitar o convite do corintiano Waldir Ungarette, figura carimbada e querida nos botecos da Santa Cecília, para conhecer o Alambique Canabella. E não haveria “gancho” jornalísti­co melhor do que o “Dia Nacional da Cachaça”, comemorado no último dia 13, para conhecer de perto o processo de produção desta bebida, que de fato é um orgulho nacional.

Pureza é obsessão

Encravado na divisa dos municípios de Paraibuna e Salesópoli­s, o Alambique Canabella fica num belo pedaço de terra entre o Vale do Ribeira e a mata atlântica. Confesso que fiquei surpreso com as instalaçõe­s da destilaria. Mesmo prezando pela produção artesanal, a estrutura do alambique é totalmente moderna e profission­al. Há muito cuidado com a produção. O mestre alambiquei­ro da casa, José Arnaldo Prado, conta que o segredo da Canabella começou na escolha da cana: “Pesquisamo­s várias espécies de cana até achar a que melhor se adaptasse à qualidade do nosso solo”. A gramínea é orgânica e se aproveita do solo rico e clima propício da região, que é próxima das nascentes do Tietê.

Ao conversar com a equipe do alambique fica nítida uma obsessão em torno de um objetivo: obter a máxima pureza da bebida. “Temos um cuidado especial com o ciclo do canavial”, diz a gerente de produção Cleide Tonin. “Para atingir um bom grau de pureza, a limpeza é fundamenta­l em todas as partes do processo, a começar pela lavagem da cana cortada, antes de passar pelo engenho”, acrescenta Cleide.

Tanto carinho rendeu frutos. Nos últimos anos, as cachaças feitas em Paraibuna começaram a despontar em rankings especializ­ados, como a prestigiad­a “Cúpula da Cachaça”. Além disso, aguardente­s da casa receberam certificad­os de pureza de institutos renomados, como a Esalqusp, de Piracicaba, e o Ibilceunes­p, de São José do Rio Preto.

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Fotos Otavio Valle Salão com sistema de alambique, que é feito de cobre

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