O Estado de S. Paulo

Despovoar favelas salvaria 41 mil em SP e RJ, diz estudo

Simulador feito por especialis­tas, incluindo professor do Insper, sugere retirada para equipament­os públicos ou hotéis, aliada a medidas de higienizaç­ão e saneamento, oferta de renda e ampliação de leitos; governos destacam que já adotam ações em áreas pe

- Giovana Girardi / COLABORARA­M MARCO ANTÔNIO CARVALHO e ROBERTA JANSEN

Especialis­tas creem que uma série de medidas contra o novo coronavíru­s nas favelas de São Paulo e Rio – que inclui a retirada temporária de metade dos moradores e a distribuiç­ão de produtos de higiene – poderia salvar 41 mil pessoas.

A adoção de uma série de medidas contra o novo coronavíru­s em favelas – incluindo reduzir até pela metade a densidade demográfic­a, criar estruturas de saneamento emergencia­is e oferecer produtos de higiene – poderia diminuir a pressão sobre o sistema de saúde e salvar até 26 mil vidas no Estado de São Paulo e até 15 mil no Rio.

Os cálculos são de um grupo de pesquisado­res especialis­tas em modelagem de dinâmica de sistema que se uniram ao coletivo Favelas contra o Coronavíru­s. Uma vez que nas comunidade­s é praticamen­te impossível aplicar o isolamento social – uma das principais recomendaç­ões contra covid-19 – e nem sempre é garantido que a medida mais eficaz de proteção seja posta em prática o tempo todo, que é lavar as mãos, a ideia dos pesquisado­res foi propor outras saídas. Essas incluem um esvaziamen­to das favelas.

Eles criaram um simulador para estimar o efeito de ações combinadas em diferentes proporções: remoção temporária de moradores das favelas para equipament­os públicos ou para hotéis; subsídio a insumos de higiene; renda básica para comprar produtos de higiene; estruturas emergencia­is de saneamento; expansão de UTIs e uso de máscaras faciais.

A primeira análise foi feita para o Estado do Rio, onde vive, proporcion­almente, a maior população em favelas no Brasil. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a (IBGE), são 2,2 milhões nessa condição, 13% da população, em uma densidade demográfic­a média de 9,9 mil/km².

Na melhor combinação de medidas, o grupo avaliou que reduzir pela metade a densidade demográfic­a das favelas do Estado, com a transferên­cia temporária de cerca de 5 mil pessoas/km², a criação de estruturas emergencia­is de saneamento em todas as favelas que não têm o serviço, o fornecimen­to de produtos de higiene para 50% dos domicílios, e a construção de 20 UTIs/dia no Estado desde o início da epidemia poderiam salvar até 15 mil vidas – ou 16% das potenciais vítimas.

Sem intervençõ­es (não só nas favelas, mas em todo o Estado), estimam os pesquisado­res, o Rio poderia ficar entre 41 e 93 dias sem vagas em UTIs (do melhor

ao pior cenário). Com essa estratégia acima, os dias sem UTI cairiam para algo entre 34 (no melhor cenário, com outras intervençõ­es) e 52 dias.

Para São Paulo, essas mesmas condições poderiam salvar até 26 mil vidas, ou 14% das potenciais vítimas. Sem intervençã­o, o Estado poderia ficar entre 42 (melhor cenário) e 105 (pior cenário) dias sem vagas em UTI para novos doentes (não só de coronavíru­s, mas de qualquer doença ou acidente).

Com essas medidas, os dias sem leito disponível caem para algo entre 38 e 70 dias sem UTI. “Estamos diante de um problema que é piorado pela desigualda­de, pela pobreza”, afirma o engenheiro Vinícius Picanço, professor de Operações e Sustentabi­lidade do Insper.

Governo. Os governos têm propostas para avaliar a situação em áreas periférica­s. A Prefeitura de São Paulo informou que realizou mapeamento de todas

as comunidade­s com o objetivo de direcionar doações de alimentos e kits de higiene. Outra medida é a instalação prevista de 100 pias em “pontos estratégic­os”. Além disso, estuda transforma­r um CEU em Paraisópol­is em hospital de campanha. Já o governo do Estado destacou a suspensão da cobrança da tarifa social de água para 506 mil famílias, além de subsídios para alunos carentes e ampliação do serviço Bom Prato.

No Rio, o Estado e a prefeitura

também lançaram ações de higienizaç­ão em mais de 50 comunidade­s. E 40 novos caminhões-pipa foram ofertados somente para atender a essas áreas carentes.

Além disso, a Secretaria de Assistênci­a Social reservou mil quartos de hotéis para abrigar idosos e outras pessoas em condições mais vulnerávei­s. Até agora, no entanto, apenas 43 quartos foram ocupados.

“Não tem uma ‘bala de prata’. Não dá para confiar em uma medida só e dizer que com isso estará tudo bem. O simulador ajuda a fazer a combinação das dosagens adequadas para cada favela. Não temos uma solução única.”

Vinícius Picanço

PROFESSOR DE OPERAÇÕES E

SUSTENTABI­LIDADE DO INSPER

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