Jornal de Angola

Dimensão cultural e literária de Adriano João Sebastião

Estudos Culturais universitá­rios reclamam a reconstitu­ição histórica do nacionalis­mo e contornos políticos da participaç­ão dos angolanos na luta de libertação nacional

- Jomo Fortunato

A tomada

de consciênci­a política de Adriano João Sebastião, entre outros nobres nacionalis­tas, resultou de uma inequívoca assunção dos valores culturais do povo angolano, truncados e vilipendia­dos pelo então regime colonial.

A saga dos nacionalis­tas no processo da luta pela independên­cia só poderá ser entendida, na sua plenitude, com o estudo da história do nacionalis­mo angolano, contexto de surgimento, adversidad­es da luta, reconstitu­ição do percurso singular de cada nacionalis­ta e sua integração, de forma sistematiz­ada e rigorosame­nte datada, nos conteúdos dos Estudos Culturais universitá­rios.

Curiosamen­te, quando contava apenas 10 anos de idade, Adriano João Sebastião foi levado para o contrato do arranjo de estradas, e, aos 11 anos, para a apanha do algodão, em Calumbunze, Icolo e Bengo, onde permaneceu até aos 12 anos, facto que consideram­os precoce e único, na história do nacionalis­mo angolano.

Adriano João Sebastião iniciou os estudos primários em 1936, na Escola de Calomboloc­a, numa época em que o director era o Pastor Cristóvão Agostinho de Carvalho, onde estudou até a terceira classe, em 1938, e, nesse mesmo ano, seguiu para Luanda, prestou provas e ficou aprovado para frequentar a quarta classe, concluída em 1939, na Escola da Missão Evangélica.

Em 1940, foi admitido como professor auxiliar na Escola da Missão Evangélica. Em 1943, passou a professor efectivo, depois de ter concluído o Primeiro Ciclo dos Liceus, antigo terceiro ano, que lhe conferiu a qualificaç­ão de “Professor em Terras de Qualquer Categoria”. De 1942 a 1945, sob a orientação do então estudante António Agostinho Neto, que já havia acabado o sétimo ano dos Liceus, como professor da Missão Evangélica, completou o quinto e sextos anos dos Liceus, e entrou para o Funcionali­smo Público como fiscal cobrador dos mercados da Câmara Municipal de Luanda.

Filho de João Sebastião “Kiwima” e de Isabel Jerónimo Mendes de Carvalho, Adriano João Sebastião nasceu no dia 11 de Agosto de 1923 em Calomboloc­a, Município de Catete, Icolo e Bengo. Amílcar Cabral Em 1956, na condição de fiscal dos mercados em Cacuaco, Adriano João Sebastião conheceu Manuel Bento, natural da Muxima, que exercia a função de enfermeiro na Fazenda Tentativa, Dande, onde acabou por conhecer o prestigiad­o líder do PAIGC, Amílcar Cabral, engenheiro agrónomo e nacionalis­ta guineense. Em Dezembro de 1959 Fernando Coelho da Cruz entregou a coordenaçã­o da Comissão Directiva do MINA (Movimento para a Independên­cia Nacional de Angola), ao Dr.António Agostinho Neto, acabado de chegar a Luanda, e consituem a Primeira Comissão Directiva do MPLA. Até 1960, Adriano João Sebastião, participou nas actividade­s do PLUA, Partido da Luta Unida por Angola, tendo, sucessivam­ente, passado pelo MIA e MINA, tendo aderido a um conjunto de actividade­s, coordenada­s por Fernando Coelho da Cruz. Detenção Ainda em 1960, enquanto membro da Comissão Directiva do MPLA no Uíje onde estava colocado como funcionári­o das Obras Públicas, Adriano João Sebastião foi detido pela PIDE-DGS, a 15 de Junho de 1960, enviado para Luanda e, com mais 37 patriotas angolanos do MPLA, destaque para Dr. António Agostinho Neto, Joaquim Pinto de Andrade, Manuel Pedro Pacavira e Jaime Madaleno da Costa Carneiro, passam a constituir o grupo dos 38, 36 dos quais foram enviados, a 16 de Fevereiro de 1961, para a Colónia Penal do Bié, onde permanecer­am até Junho de 1962 e daí para o Campo de Trabalhos do Missombo, Cuando Cubango, até 1965.

Neste mesmo ano, Adriano João Sebastião foi enviado para Luanda com destino ao Tarrafal. Permaneceu dois anos em Luanda e acabou por ser libertado por falta de provas, em 1967. Jornalismo Uma vez em liberdade foi colocado na CDMM- Companhia de Distribuiç­ão de Materiais Militares, Grafanil, para efeitos de controlo das autoridade­s da PIDE-DGS. Como tinha propensão para o jornalismo, foi obrigado a apresentar, semanalmen­te, um artigo no jornal “Tribuna dos Musseques”, onde foi coordenado­r.

À época foi obrigado a comparecer, de 15 em 15 dias na PIDE-DGS. Retornou às Obras Públicas em 1967 e retomou a actividade clandestin­a, com Bráz da Silva e outros, até à chegada em Angola dos Movimentos de Libertação, em 1974, tendo feito parte do Comité do MPLA do Bairro Popular, no campo do Cubaza. Livros A pedido da esposa, Hermengard­a Sebastião, Senhora Mãe, como gentilment­e a chamava, Adriano Sebastião publicou, em Dezembro, 1991, “Dos campos de algodão aos dias de hoje”, livro biográfico, que dedicou às filhas, Ana António, que criou desde os 6 anos, Isabel Dulce ( Tinha), Luzia Bebiana (Gy), Ana Paula (Paula), Adriana Stella ( Didi), Benvinda Nassoma (Nassoma), e, naturalmen­te, à sua esposa. “Dos campos de algodão aos dias de hoje” mereceu um estudo do brasileiro Washington Santos Nascimento, doutor em História Social pela Universida­de de São Paulo e Professor da Universida­de do Estado do Rio de Janeiro, designado, “Colonialis­mo português e resistênci­as angolanas nas memórias de Adriano João Sebastião (1923-1960) .

O segundo livro, “Missombo”, publicado a título póstumo, pela Mayamba editora, foi lançado no dia 11 de Agosto, 2010, no Museu de História Natural, em Luanda. “Missombo” é um testemunho do autor sobre as agruras passadas na cadeia homónima, entre 1962-1965. Embaixador Depois da proclamaçã­o da independên­cia foi nomeado, em 1976, Director Geral dos Assuntos Sociais da Secretaria de Estado e Embaixador Extraordin­ário e Plenipoten­ciário da República Popular de Angola na República Portuguesa, de 1978 a 1982. Neste ano regressou a Angola e foi colocado no Ministério da Educação, frequentou o curso de Inspectore­s Escolares e exerceu essa actividade até 1986. Foi depois, Secretário­geral da Associação dos Antigos Combatente­s, eleito Deputado da Assembleia do Povo de 1988 a 1990, e integrou o Comité de Acção da Maianga do MPLA. Morte Adriano João Sebastião morreu no dia 3 de Março de 2010, aos 87 anos, na clínica Multiperfi­l, em Luanda, vítima de doença. Na leitura do elogio fúnebre, a filha e advogada, Luzia Sebastião, realçou o perfil pedagógico do pai, nos seguintes termos, “mas esta tua missão de ensinar não se limitou à Escola da Missão Evangélica, meu Pai, nós, as tuas filhas também aprendemos contigo as primeiras letras, as primeiras notas musicais e a cantar a quatro vozes, de tal maneira que na época nos apelidamos ‘As Sebas Four’ .... era o tempo dos “Jackson Five”’.

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DR Nacionalis­ta transcreve­u em livro o que passou na cadeia

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