Seropositivos estão a abandonar o tratamento
Falta de dinheiro de transporte para a busca de medicamentos é uma das principais razões
Mais de 22 por cento de pessoas infectados pelo vírus da sida em Angola estão a abandonar o tratamento, revelou, quarta-feira, em Luanda, o secretário executivo da Rede Angolana das Organizações de Serviços contra a Sida (Anaso), que disse haver três razões para o abandono da terapia à base de anti-retrovirais.
António Coelho, que falava ao Jornal de Angola, acentuou que alguns abandonam o tratamento por viverem distante das unidades sanitárias, outros por acharem forte a dosagem prescrita e ainda um outro grupo de pessoas que se dizem vítimas de discriminação vinda de técnicos de saúde, quando se deslocam a estabelecimentos de saúde à procura de tratamento.
O activista social adiantou que o primeiro grupo que desiste do tratamento é integrado por pessoas que vivem, sobretudo, noutras províncias do país, algumas das quais não têm dinheiro para viajar 300 a 400 quilómetros para poderem chegar a uma unidade sanitária, onde adquirem os medicamentos que atenuam a progressão do vírus no organismo.
“A longa distância que têm que percorrer para o acesso ao medicamento é a causa do abandono em algumas províncias”, disse António Coelho, informando que mais de 80 por cento dos seropositivos são pessoas de baixo rendimento, não tendo por isso capacidade de resposta do ponto de vista nutricional. Em Angola, são acompanhados cerca de 200 mil seropositivos e destes apenas 90 mil estão em tratamento, um assunto que a Rede Angolana das Organizações de Serviços contra a Sida considera preocupante. António Coelho, que falava à margem de um seminário sobre
“Proposta do programa do encontro sobre a revisão do Plano Estratégico Nacional”, realizado no Instituto Nacional de Saúde Pública”, assegurou que a Rede Angolana das Organizações de Serviços contra a Sida tem estado a trabalhar na busca activa de pessoas que abandonaram o tratamento. “A qualidade dos serviços destinados às vítimas da sida tem de ser melhorada, além da capacidade e conhecimento dos mobilizadores sociais.”
António Coelho disse que, embora o Governo tenha estado a disponibilizar verbas para a compra de anti-retrovirais, reagentes e testes, ainda se regista ruptura de stocks, um problema que pode deixar de existir se houver uma estratégia de gestão rigorosa das reservas, que passa pela formação contínua dos recursos humanos.
Sobrevivência das ONG
O secretário executivo da Rede Angolana das Organizações de Serviços contra a Sida informou que, das 315 organizações não-governamentais que trabalham no combate ao VIH/Sida, estão apenas em funcionamento 48, “o que demonstra as grandes dificuldades que as organizações enfrentam para a sua sobrevivência”.
A maioria paralisou a actividade devido à crise económica e financeira, encontrando-se neste grupo organizações não-governamentais nacionais e internacionais. As internacionais estão actualmente a abandonar o país por esse motivo, frisou António Coelho, que disse haver uma outra preocupação, que tem a ver com a sustentabilidade da área técnica das organizações não-governamentais.
Por este motivo, avançou o activista, não tem sido possível reter “os quadros que estão ao serviço das organizações não-governamentais”, havendo já casos de técnicos que mudaram de actividade profissional, na ânsia de obterem melhores condições de vida.
“As organizações sem fins lucrativos sobrevivem apenas da implementação de projectos e programas que gerem, e sem financiamento não há como avançar", declarou o activista social, para quem a redução do número de intervenções nas comunidades é uma consequência da falta de financiamento.
As 48 organizações da sociedade civil em actividade desenvolvem apenas acções pontuais nas comunidades, mas também graças à existência de duas organizações internacionais - o Fundo Global e a USAID, que financiam projectos no país.
Para resolver o problema, a Rede Angolana das Organizações de Serviços contra a Sida e os seus parceiros estão, actualmente, a identificar novos parceiros sociais e criar mecanismos próprios de mobilização de recursos adicionais. Além disso, a Rede Angolana das Organizações de Serviços contra a Sida está a criar fóruns de coordenação e de concertação para a partilha de experiências e informações.
Sobre a mobilização de recursos adicionais, António Coelho revelou que a ANASO quer envolver as comunidades nas acções desenvolvidas e identificar “padrinhos", empresas públicas e privadas, para que possam também apoiar as acções voltadas para o combate à sida no país.