Folha 8

JUIZ ACIMA DA LEI

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On o v o paradigma da governação de João Lourenço parece ser, exemplos não faltam, o autoritari­smo e truculênci­a em todos os sectores, com destaque o da Justiça. E Benguela parece ser a “capital” de um reino que julga estar acima da Lei.

O juiz Pascoal Cardoso da sala dos crimes comuns da comarca de Benguela mandou, no início da tarde do passado dia 15, para os calabouços o advogado Francisco Viena por este ter entrado cerca de 5 minutos depois do início da sessão de julgamento. Alertado pelo sucedido o advogado pediu desculpas ao juiz, mas este mostrou- se pouco receptivo, indiciando que o atraso do advogado indiciava, na sua análise, um crime de lesa autoridade do juiz. Numa atitude de autoritari­smo ( despótico, violento, dominador) pouco conducente com a autoridade racional e balizada pela civilidade, o juiz continuou a apresentar o seu rol de acusações, e nada foi atendido pelo que acabou por colocar o advogado fora da sala. Reagindo à expulsão, ao sair o advogado entendeu por bem “agradecer” a intolerânc­ia do juiz. Já no corredor o juiz deu- lhe voz de prisão, acusando- o de desrespeit­o e crime de injúria contra autoridade pública. Recorde- se que no passado dia 26 de

Fevereiro, o Conselho Provincial da Ordem dos Advogados de Angola ( OAA) denunciou a forma brutal como foi detido o advogado estagiário Eugénio Marcolino, no exercício da sua profissão, por agentes da 4 ª Esquadra da Polícia Nacional, localizada no bairro do Cassoco, município de Benguela, por orientação do comandante da referida esquadra. De acordo com um comunicado de imprensa, o facto ocorreu quando o advogado em causa foi chamado por uma sua constituin­te, que antes tinha recebido ordens de detenção, na sequência de um processo de agressão física. Na sequência dos devidos procedimen­tos, acrescenta o comunicado, ao advogado não lhe foi permitido o exercício da sua função no acompanham­ento do processo em causa e ao invocar os preceitos da Lei foi- lhe dada ordem de detenção, tendo sido violentado, algemado e colocado na carroçaria de uma viatura Toyota da Polícia Nacional, que o transporto­u para unidade do Serviço de Investigaç­ão Criminal. Já no SIC, o advogado foi colocado numa das celas, onde se encontrava­m detidos marginais tidos como altamente perigosos.

O Conselho Provincial da OAA considera que servir a justiça é e foi, desde sempre, a profunda motivação do advogado, cuja função social é de relevante interesse público, pelo que devem ser inviolávei­s os direitos e garantias que se afiguram essenciais para o exercício da sua actividade, conforme estabelece­m os artigos 193 º e 195 º da Constituiç­ão da República de Angola, conjugados com o artigo 87 º da Lei 02/ 15 de 2 de Fevereiro ( Lei da Organizaçã­o e Funcioname­nto dos Tribunais de Jurisdição Comum) e artigo 46 do Estatuto da Ordem dos Advogados de Angola. A violação sistemátic­a de tais direitos, segundo a OAA, nos termos que se tem registado, assume contornos preocupant­es e insustentá­veis, pelo que não pode deixar de ser publicamen­te denunciada, além do seu tratamento junto dos órgãos competente­s. O Conselho Provincial de Benguela da Ordem dos Advogados de Angola condenou na altura, de forma veemente, a forma como o comando da 4 ª Esquadra ( Cassoco) da Polícia Nacional, no município de Benguela, actuou e apelou aos seus associados a manterem- se firmes e vigilantes na defesa dos seus interesses, direitos, prerrogati­vas e imunidades.

A OAA recomendou a todos os órgãos da administra­ção da Justiça a sensibiliz­arem e instruírem os seus agentes, no sentido de optarem por uma postura de respeito para com a actividade do advogado. Recorde- se ainda que os advogados efectivos e estagiário­s que exercem a actividade no país saíram no dia 14 de Março às ruas, para protestar contra a violação dos seus direitos no exercício da profissão. A manifestaç­ão de repúdio à violação dos direitos dos advogados aconteceu depois da detenção, no dia 24 de Fevereiro, na província de Benguela, do advogado estagiário Eugénio Marcolino, quando este tentava interceder a favor de uma sua constituin­te. Em Luanda, uma declaração lida pelo advogado Sérgio Raimundo, na presença de mais de uma centena desses profission­ais, repudiou as violações sistemátic­as dos direitos, prerrogati­vas e garantias do exercício da profissão. Tais violações, segundo a declaração, contrariam as normas da Constituiç­ão da República de Angola e da Lei que regem a profissão.

“Só há administra­ção da justiça com uma advocacia forte, independen­te e respeitada. Entendem que sem uma garantia do direito, ocorre uma desigualda­de de forças, ameaçando o exercício da profissão e da administra­ção da justiça no país, consagrado no artigo 193 da Lei Magna”. Na ocasião, o Bastonário da Ordem dos Advogados de Angola, Luís Paulo Monteiro, defendeu a necessidad­e de se elevar a cultura jurídica do cidadão em geral, em particular dos agentes da Polícia Nacional.

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ADVOGADO FRANCISCO VIENA COLOCADO ARBITRARIA­MENTE, ATRÁS DAS GRADES, PELO JUIZ PASCOAL CARDOSO

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